Marcos, o Desertor Restaurado
Este é o primeiro de dezenas de sermões de John MacArthur sobre todo o Evangelho de Marcos. Veja detalhes e links no fim do texto
Vamos voltar a nossa atenção para todo o livro de Marcos. Esta é uma nova etapa em nossa vida na igreja e uma experiência um pouco marcante para mim, pois há 40 anos atrás, quando eu aqui cheguei, era meu objetivo ensinar todo o Novo Testamento, verso por verso. Fiz isso nesses 40 anos e cheguei finalmente ao último livro, o livro de Marcos.
E com a conclusão deste livro, todo o Novo Testamento terá sido ensinado aqui em nossa igreja. E que imenso privilégio, incalculável, tem sido para mim! Acho que você vai gostar, penso que vai amar, vai valorizar sua experiência no evangelho de Marcos. Vamos abrir o primeiro verso e ler esse versículo com o entendimento de que este é o título do livro: “Princípio do evangelho de Jesus Cristo, o Filho de Deus.”
Jesus não escreveu nenhuma autobiografia. É uma curiosidade notar que Jesus nunca escreveu nenhum livro. Todos os livros do Antigo Testamento foram escritos por homens, inspirados, com certeza, pelo Espírito Santo. Todos os livros do Novo Testamento foram escritos por homens, também inspirados pelo Espírito Santo. O próprio Jesus – como homem – não escreveu nenhum livro, nem mesmo a Sua própria história. Não há autobiografia.
Mas o Espírito de Deus selecionou quatro homens para escreverem histórias da vida de Jesus, Sua obra, Sua morte e Sua ressurreição. Eles são: Mateus, Marcos, Lucas e João. Sabendo que o Espírito Santo inspirou cada escritor, então cada um dos Evangelhos é sem erro, perfeito. É o sopro de Deus. Para tomar emprestada a linguagem de Paulo, ou nas palavras de Pedro, em 2 Pedro 1:20 e 21, nenhuma Escritura veio por qualquer origem humana, mas “os santos foram movidos pelo Espírito de Deus”, e assim escreveram.
Então, não estamos surpresos que apesar de Mateus, Marcos, Lucas e João terem escrito suas histórias independentemente uns dos outros, em diferentes momentos e em diferentes lugares, os quatro Evangelhos estão em perfeita harmonia, porque o autor divino, o Espírito Santo, superintendeu cada escritor. E você tem nesses quatro Evangelhos relatos históricos que são perfeitamente compatíveis. Neles está a história da encarnação do Senhor Jesus Cristo, o Filho de Deus, narrada a partir de quatro perspectivas.
Agora, vamos começar a ver história de Jesus contada por Marcos e vamos ver a sua singularidade. Quando os Evangelhos foram escritos, já existiam outros livros do Novo Testamento. O livro de Tiago, o qual li esta manhã, já existia. O livro de Gálatas já havia sido escrito pelo apóstolo Paulo. Eles foram os dois primeiros livros do Novo Testamento e foram escritos antes de qualquer um dos Evangelhos ser escrito.
Certamente há razão para isso. As pessoas necessitavam de orientação, como a dada em Gálatas, para que pudessem ser protegidas do falso evangelho que os judaizantes estavam pregando. O sofrimento dos crentes perseguidos precisava de consolo e encorajamento, e é por isso que o livro de Tiago foi escrito. Mas não foi tão crucial no início da história da igreja que os Evangelhos fossem escritos, porque testemunhas oculares que estiveram com Cristo e O viram e ouviram ainda estavam vivas. E assim, havia muitas pessoas que poderiam dar testemunho da história de Jesus Cristo.
O último apóstolo, João, morreu depois de 90 d.C. e os Evangelhos começam a aparecer em meados do primeiro século. O primeiro que foi escrito foi Mateus. O próximo foi Marcos. Então, veio o Evangelho segundo Lucas. E cerca de 30 anos depois, por volta de 90 d.C., foi escrito o Evangelho de João.
Antes que os Evangelhos fossem escritos, havia muitos relatos de testemunhas oculares, havia muitas testemunhas vivas que tinham presenciado a vida de Cristo. E havia alguns fragmentos escritos, aos quais Lucas se refere em seu Evangelho, no capítulo 1, versículos 1 e 2.
Tendo, pois, muitos empreendido pôr em ordem a narração dos fatos que entre nós se cumpriram, degundo nos transmitiram os mesmos que os presenciaram desde o princípio, e foram ministros da palavra (Lucas 1:1-2).
Assim, aqueles testemunhos escritos da vida e ministério de Jesus Cristo, bem como a história verbal de testemunhas oculares, constituíram a fonte da verdade sobre Cristo antes de os Evangelhos terem sido escritos.
Em meados do primeiro século, porém, as testemunhas oculares da vida e ministério de Jesus começaram a morrer. E realmente era necessário que o registro sobre a vida e obra de Cristo fosse escrito. Assim, o Espírito Santo selecionou homens para fazer isso: Mateus, Marcos, Lucas e João. Depois que os quatro Evangelhos foram escritos, nenhum outro escrito sobre Jesus Cristo foi aceito pelos crentes como Escritura autorizada e inspirada. São estes quatro Evangelhos e nada mais.
A afirmação universal da igreja primitiva era que estes eram os verdadeiros Evangelhos. Sim, mais tarde os evangelhos gnósticos apareceram com falsa autoria, como por exemplo o Evangelho de Pedro, o de Tomé etc. Eles eram falsificações gnósticas, anti-Deus e satânicas, destinadas a confundir as pessoas e minar a verdade. Mas o testemunho universal da igreja era que aqueles quatro Evangelhos que temos em nossas Bíblias são os únicos Evangelhos. Eles resistiram ao exame de vários estudiosos durante os dois mil anos desde que foram escritos. Sua harmonia é magnífica. É algo inequívoco.
É verdade que eles tiveram um único autor divino, porque estão em perfeita harmonia uns com os outros. Entre os anos 50 e 60 d.C. Mateus escreveu seu Evangelho. Entre os anos 60 e 61, Lucas escreveu o seu. No ano 90, João escreveu o seu relato. Marcos foi escrito entre Mateus e Lucas, talvez no final dos anos 50. Marcos não contém os discursos e a teologia que os outros Evangelhos contêm.
João é a grande obra-prima cristológica que apresenta a pessoa de Cristo como evidenciada por Suas reivindicações e milagres. Mateus e Lucas estão repletos de discursos nos quais recebemos a instrução de Cristo. Marcos não tem esses grandes discursos nem perto do grau que os outros Evangelhos fazem. De fato, existem apenas dois capítulos em Marcos que são realmente capítulos discursivos – seriam o capítulo 4, no qual Marcos nos dá as parábolas de Jesus, e o capítulo 13, que é a apresentação de Marcos do Sermão do Monte das Oliveiras, no qual Jesus ensina sobre Sua Segunda Vinda.
Aqui e ali, espalhados por Marcos, há alguns segmentos de ensino, é claro, mas é principalmente um Evangelho de ação. É uma espécie de edição de jornal. É rápido. É um Evangelho de ação. No mundo antigo, a maioria das pessoas era analfabeta, particularmente no mundo romano. E esse Evangelho de Marcos foi escrito em Roma para os cristãos romanos. Porém eles eram, na maior parte, analfabetos e, portanto, o livro tinha que ser lido para eles.
Assim, o Evangelho de Marcos é como uma história em ritmo acelerado que pode ser compreendida e pode manter as atenções enquanto é lida. O livro tem um encanto diferente dos outros Evangelhos, como veremos. Mas, vamos conhecer o seu autor.
Se você olhar o primeiro verso, não encontrará o nome dele. Nenhum dos autores dos quatro Evangelhos se identifica como autor. Apesar de a história da conversão de Mateus e da sua inclusão entre os apóstolos aparecer no Evangelho de Mateus, o próprio Mateus nunca diz no texto que ele é o seu autor. Lucas nunca aparece em seu Evangelho, nem afirma ser o autor dele.
João, embora apareça em seu Evangelho, especialmente porque ele era um apóstolo íntimo de Cristo, nunca se refere a si mesmo como João, mas sempre como “aquele a quem Jesus amava”. Então, não temos esses Evangelhos começando com uma indicação de sua autoria. É claramente uma indicação do fato de que esses autores queriam dar toda a glória a Cristo.
Eles queriam que a história fosse sobre Jesus e por isso se esconderam, por assim dizer, por trás da história Daquele que deveria receber a preeminência. No entanto, ainda sabemos inequivocamente que Marcos escreveu seu Evangelho, assim como também Mateus, Lucas e João escreveram os seus. Esse é o testemunho universal da igreja primitiva desde o primeiro século.
Mas, vamos conhecer Marcos. Já que ele não aparece no Evangelho de Marcos e não aparece nos Evangelhos de Mateus, Lucas e João, nós temos que encontrar a primeira referência onde ele aparece, e é no livro de Atos, capítulo 12. Vamos falar um pouco sobre o cenário desse capítulo de Atos, no qual Marcos é citado pela primeira vez no Novo Testamento. Atos retrata um ponto de transição muito significativo.
Os Evangelhos terminam com a ressurreição de Cristo. A ressurreição de Cristo encerra a história de Cristo na Terra. O livro de Atos, escrito por Lucas, começa com Jesus passando 40 dias na Terra após a ressurreição, ensinando a Seus discípulos coisas relativas ao Reino de Deus, preparando-os para cumprir a comissão que vem no capítulo 1, verso 8, que diz:
Mas recebereis a virtude do Espírito Santo, que há de vir sobre vós; e ser-me-eis testemunhas, tanto em Jerusalém como em toda a Judéia e Samaria, e até aos confins da terra.
Assim, Jesus os prepara para o ministério mundial em 40 dias, ensinando-os os assuntos concernentes ao Reino de Deus. E então, o Espírito de Deus vem. O Espírito vem sobre eles, capacita-os para esse ministério e a igreja é lançada. Nos primeiros doze capítulos, a história contada é a do avanço do evangelho na Judéia e Samaria. Começando no capítulo 13, vemos o evangelho começando a ser espalhado nos confins da Terra.
Nos primeiros doze capítulos de Atos, em que o evangelho avança na Judéia e Samaria, o principal pregador, o pregador dominante é Pedro. Na segunda metade, a partir do capítulo 13, o pregador dominante é Paulo. Então, o livro de Atos se divide na primeira metade sendo Pedro o pregador principal, e na segunda metade sendo Paulo. A primeira metade cumpre a ordem do Senhor de que o evangelho deveria ser espalhado na Judéia e Samaria, enquanto a segunda metade se refere ao evangelho sendo espalhado nos confins da Terra, cumprindo a ordem do capítulo 1, versículo 8.
Então, quando chegamos ao capítulo 12, estamos no final do ministério do apóstolo Pedro. Ele dominou a pregação apostólica do evangelho e dominou o crescimento da igreja na Judéia e Samaria. Ele está prestes a desaparecer da narrativa de Atos, e o apóstolo Paulo deve ascender ao palco ou expandir o evangelho até os confins da Terra. A primeira metade do livro de Atos está se fechando quando chegamos ao versículo 1, capítulo 12, que começa assim: “E por aquele mesmo tempo…”. Que tempo?
Bem, para saber volte ao versículo 27 de Atos 11. Alguns profetas desceram de Jerusalém para Antioquia. Você sempre “desce” de Jerusalém, mesmo que vá para o norte, porque Jerusalém é elevada. Eles desceram de Jerusalém e depois seguiram para o norte, para Antioquia. Um deles, chamado Ágabo, levantou-se e começou a indicar, pelo Espírito, que certamente haveria uma grande fome em todo o mundo. Isso aconteceu no reinado de Cláudio César. E, de acordo com a condição financeira de cada discípulo, cada um deles determinou enviar uma contribuição para ajuda dos irmãos que viviam na Judéia.
Assim, os crentes em Antioquia – ou os discípulos em Antioquia – decidiram levantar uma contribuição e enviá-la a Jerusalém para ser distribuída aos crentes ali que estariam na fome. E eles fizeram isso, versículo 30, e enviaram as ofertas, por intermédio de Barnabé e Paulo, para os anciãos da igreja de Jerusalém. Então, é a isso que Lucas está se referindo no versículo 1 de Atos 12, quando diz: “E por aquele mesmo tempo…”. Era o tempo de fome e o tempo das ofertas vindas da igreja de Antioquia, pelas mãos de Barnabé e Saulo, para os anciãos na igreja de Jerusalém.
“E por aquele mesmo tempo o rei Herodes estendeu as mãos sobre alguns da igreja, para os maltratar…”. Esse seria Herodes Agripa I. Ele foi educado em Roma. Ele cultivou sua aceitação pelos judeus, pois era um típico político. Ele realmente não gostava dos judeus, mas sabia que seria vantajoso bajular os judeus, a fim de conseguir ser rico, próspero e poderoso. Assim, Herodes Agripa cortejava o favor dos judeus. Então, você tem essa afirmação feita no versículo 3: “Quando ele viu que isso agradou aos judeus…”. Isso foi o que impulsionou Herodes.
Ele não era judeu, era idumeu, era um rei com pouca expressão ou importância naquela parte do mundo. Ele sabia que prosperaria muito mais rápido no Império Romano se tivesse os judeus do seu lado. E foi o que ele fez. Sabendo que maltratar a igreja agradou aos judeus, ele lançou uma perseguição contra a igreja. A igreja agora estava mal vista. Era odiada pelos judeus, como você bem sabe. Herodes prendeu Tiago, o irmão de João, um dos apóstolos, e ordenou que fosse morto à espada. Tiago foi o primeiro apóstolo martirizado. Estevão foi, de fato, o primeiro mártir cristão, mas ele não era apóstolo.
Quando Herodes viu que isso agradou aos judeus, ou seja aos líderes judeus e todos os que estavam sob sua influência, ele então prendeu Pedro: “ora, se os judeus gostaram da morte de um apóstolo, vamos matar outro!”. Então, ele prende Pedro. Essa prisão de Pedro se deu durante os dias de pão sem fermento, o que significava que a cidade estava cheia de peregrinos. Pedro foi preso, colocado numa prisão e entregue a quatro esquadrões de soldados para guardá-lo. O que isso significa? Simplesmente significa vigilância por 24h por dia, em que cada um desses esquadrões tinha um turno de 6h.
Além de toda essa vigilância, eles o tinham acorrentado também. Eles achavam que Pedro poderia de alguma forma se livrar das correntes? Não, mas eles estavam bem conscientes do seu poder e influência na crescente igreja que já estava com milhares de pessoas agora, se não dezenas de milhares. E eles temiam que poderia haver alguns que viessem libertá-lo. E assim, eles colocaram Pedro aos cuidados dos soldados 24h por dia, não apenas dentro de uma cela, não apenas acorrentado, mas vigiado ao extremo.
A intenção de Herodes era esperar até que a Páscoa terminasse, para minimizar o impacto para as pessoas, e depois trazê-lo para fora e executá-lo. Então, Pedro foi mantido na prisão, versículo 5. Mas a oração por ele estava sendo feita fervorosamente pela igreja a Deus. Essa era a estratégia da igreja. Não era invadir a prisão e tirar Pedro de lá, mas orar.
Na mesma noite em que Herodes estava prestes a levar seu plano de assassinato adiante, Pedro estava dormindo. Em tese, esta seria a última vez que ele poderia dormir, já que no dia seguinte ele seria trazido e executado, como Tiago tinha sido. Pedro simplesmente estava dormindo entre dois soldados. Quão rigorosa era a vigilância sobre Pedro! Continuando o texto de Atos 12:
6 E quando Herodes estava para o fazer comparecer, nessa mesma noite estava Pedro dormindo entre dois soldados, ligado com duas cadeias, e os guardas diante da porta guardavam a prisão.
7 E eis que sobreveio o anjo do Senhor, e resplandeceu uma luz na prisão; e, tocando a Pedro na ilharga, o despertou, dizendo: Levanta-te depressa. E caíram-lhe das mãos as cadeias.
8 E disse-lhe o anjo: Cinge-te, e ata as tuas alparcas. E ele assim o fez. Disse-lhe mais: Lança às costas a tua capa, e segue-me.
9 E, saindo, o seguia. E não sabia que era real o que estava sendo feito pelo anjo, mas cuidava que via alguma visão.”
Pedro pensava que estava tendo uma visão, como a que é registrada em Atos 10. Ele estava confuso e não sabia exatamente o que estava acontecendo. O verso 10 diz: “E, quando passaram a primeira e segunda guarda, chegaram à porta de ferro, que dá para a cidade, a qual se lhes abriu por si mesma; e, tendo saído, percorreram uma rua, e logo o anjo se apartou dele.” O anjo o levou onde ele precisava ir.
Agora ele estava na rua sozinho. Nesse momento, ele volta a si e diz, no verso 11: “Agora sei verdadeiramente que o Senhor enviou o seu anjo, e me livrou da mão de Herodes, e de tudo o que o povo dos judeus esperava.” Então, isso afirma novamente que Herodes estava tentando agradar os judeus e os judeus esperavam acabar com Pedro. Verso 12: “E, considerando ele nisto, foi à casa de Maria, mãe de João, que tinha por sobrenome Marcos, onde muitos estavam reunidos e oravam.” Aqui é a primeira vez que nos encontramos com João Marcos.
João era um nome judeu, Marcos era um nome gentio. Mas o texto de Atos 12 não nos diz nada sobre João Marcos. Apenas diz que Pedro foi à casa de Maria. O fato de a casa ser identificada com uma mulher e não com um homem, provavelmente significa que Maria era uma viúva. Então, aqui está uma viúva com um nome que quase todas as outras mulheres do Novo Testamento tinham, Maria. Assim, a fim de distinguir esta Maria de todas as outras Marias, Lucas a identifica como a Maria que era a mãe de João, também chamado Marcos.
Essa é a única razão pela qual o nome de Marcos é mencionado aqui nesse texto de Atos. Neste ponto, ele é alguém sobre quem não temos muita informação. Apareceu no texto apenas como uma maneira de identificar sua mãe. Pedro foi a esta casa porque, sem dúvida, a igreja se reunia nesta casa, o que significava que Pedro provavelmente havia estado muitas vezes ali. Ninguém precisou levá-lo até lá, o que significava que Pedro conhecia João Marcos e João Marcos conhecia Pedro, embora João Marcos fosse muito jovem.
O texto de Atos 12 se passa no ano 44 d.C., ou seja 14 anos após a morte de Cristo. Pedro era um pregador poderoso do evangelho, desde o Dia de Pentecostes por aqueles 14 anos. Então, ele já era bem conhecido. E Pedro – quando liberto miraculosamente da prisão – foi estar em um lugar familiar, onde se encontra com uma querida viúva, que era a mãe de João Marcos. As pessoas estavam em casa orando. Ele bate na porta, a criada chamada Rodes vem até a porta para atender.
Ela reconhece a voz de Pedro, mas fica tão alegre, que nem abre o portão. Ela apenas se vira, corre e anuncia: “Pedro está parado diante do portão!”. E eles disseram a ela: “Você está fora de si!”. Grande fé, não é? Vamos fazer uma reunião de oração, mas não vamos acreditar que o que estamos pedindo a Deus possa acontecer. Ela continuou insistindo: “É assim, é assim….”. E eles continuaram dizendo, provavelmente como sarcasmo:: “Não, é o anjo dele”.
Pedro continuou batendo. Quando eles abriram a porta, eles o viram e ficaram maravilhados. Fazendo sinal para eles com a mão, para ficarem em silêncio, Pedro lhes descreveu como o Senhor o havia libertado da prisão, e disse: “Relatem essas coisas a Tiago”. Esse Tiago não era o apóstolo, irmão de João, pois ele tinha sido martirizado. Esse é Tiago, o meio-irmão de nosso Senhor, que é o autor da epístola de Tiago e era o líder da igreja de Jerusalém. Então, Pedro diz: “Contem tudo a Tiago” – porque ele é o líder da igreja – “e para os irmãos“. E, então, Pedro foi para outro lugar.
Assim, aqui, pela primeira vez, encontramos a menção de João Marcos nas Escrituras. E, a propósito, a primeira vez que o encontramos, ele está em conexão com Pedro, mesmo que seja uma conexão muito discreta. Mas, ficamos sabendo que ele conhecia Pedro. Sabemos que Pedro já tinha estado em sua casa, porque ele foi direto para lá quando liberto da prisão pelo anjo, demonstrando que esse era um lugar familiar para ele. E essa é uma conexão muito importante para o futuro da vida de Marcos.
Tiago, como eu disse, o irmão de João, já havia sido martirizado. Esse outro Tiago, mencionado por Pedro no texto que estamos vendo, o meio irmão de nosso Senhor, também foi martirizado. A tradição diz que seu martírio se deu em 62 d.C., quando ele foi lançado do pináculo do templo e foi esmagado no chão abaixo. E, se não bastasse, seu corpo ainda foi espancado depois da queda, para que houvesse certeza de que ele havia morrido mesmo.
Por que eu te conto essa história? Porque é a primeira menção de João Marcos nas Escrituras. Nenhum escritor dos Evangelhos menciona seu nome. Então, é aqui em Atos 12 que nos encontramos com ele. E nós o encontramos em conexão com Pedro. Arquive isso em sua mente: Lucas – nesse texto de Atos – não nos diz nada sobre Marcos. Nós apenas sabemos o nome dele. Agora, vamos seguir um pouco a história.
Vá para o final do capítulo 12. Barnabé e Saulo vieram de Antioquia, certo? Eles vieram com ofertas para trazer alívio para os crentes na Judéia, Jerusalém, por causa da fome. Eles entregam as ofertas e depois voltam para Antioquia. Lembre-se, nessa época Saulo estava na igreja em Antioquia. Ele estava voltando com Barnabé, pois eram pastores da igreja em Antioquia. No entanto, verso 25 : “E Barnabé e Saulo, havendo terminado aquele serviço, voltaram de Jerusalém, levando também consigo a João, que tinha por sobrenome Marcos.”
Bem, isso é muito interessante. Eles retornam a Antioquia para sua responsabilidade e a única pessoa que eles levam com eles é este jovem chamado João Marcos. Essa é uma primeira indicação de sua utilidade, a primeira indicação de seu caráter. Marcos era um pregador? Não. Ele era um pastor? Não. Um evangelista? Não. Ele era um apóstolo? Não. Ele era um profeta? Não. Ele era um líder? Não. Ele não era nada disso. Você diz: “Bem, por que dentre todas as opções, Paulo e Barnabé levariam justamente João Marcos nessa viagem de volta a Antioquia?”
Colossenses 4:10 diz que Marcos era primo de Barnabé. Então, Barnabé o conhecia, confiava nele, sabia algo sobre seus talentos e seus dons e sugeriu a Paulo que o trouxesse junto, porque ele poderia ajudá-los não apenas na jornada, mas no ministério em Antioquia. E, a propósito, Barnabé era um levita, ou seja, servia aos sacerdotes no templo. Em toda a história judaica, os levitas serviam no templo e ajudavam os sacerdotes. Barnabé era levita. Se esse homem é seu primo, então talvez ele também estivesse na descendência da família levítica. Portanto, talvez Marcos tivesse servido no templo, estava acostumado a servir, tinha experiência no serviço do templo e na adoração no templo, e tinha a atitude de um servo.
João Marcos, então, volta para Antioquia com Paulo e Barnabé. Ele permaneceu lá, até que Paulo e Barnabé estavam prontos para partir. Você se lembra da história. Veja o capítulo 13, versículo 1: “E na igreja que estava em Antioquia havia alguns profetas e doutores, a saber: Barnabé e Simeão chamado Níger, e Lúcio, cireneu, e Manaém, que fora criado com Herodes o tetrarca, e Saulo.” Por favor, notem que o nome de Marcos não é mencionado, ou seja, ele não era pastor, ele não era mestre (ou doutor, professor de Bíblia).
Continuando, os versos 2 e 3 nos dizem: “E, servindo eles ao Senhor, e jejuando, disse o Espírito Santo: Apartai-me a Barnabé e a Saulo para a obra a que os tenho chamado. Então, jejuando e orando, e pondo sobre eles as mãos, os despediram.” Essa é a primeira viagem missionária.
Agora Paulo e Barnabé fazem a primeira viagem missionária ao mundo. Eles descem para Selêucia, versículo 4, navegam para Chipre. Verso 25: “E Barnabé e Saulo, havendo terminado aquele serviço, voltaram de Jerusalém, levando também… ” – adivinha quem? – “…João Marcos como seu…” – O que? – “…ajudante”. Essa é a palavra para entender esse homem. Ele é um ajudante. Ele provou ser útil para eles no tempo que eles estavam em Antioquia. Nós não sabemos exatamente quanto tempo se passou, mas Marcos provou ser tão útil para eles em Antioquia, que eles decidiram levá-lo na primeira jornada missionária.
A propósito, amigos, essa é a única passagem nas Escrituras que nos diz alguma coisa sobre o tipo de ministério que Marcos tinha. Ele era um ajudante. Então, Barnabé e Paulo o levaram. Não era um serviço fácil. Ministério duro. Eles se depararam com Elimas, o mágico, no verso 8 do capítulo 13 de Atos, que estava se opondo a eles. Foi difícil. Elimas foi identificado como um homem cheio de engano, filho do diabo, versículo 10, “inimigo da justiça”.
Desça ao versículo 13: “E, partindo de Pafos, Paulo e os que estavam com ele chegaram a Perge, da Panfília. Mas João, apartando-se deles, voltou para Jerusalém.” Esse é um momento triste. Marcos se torna um desertor, ele os deixou. Ele desapareceu. Ele desaparece do registro do Novo Testamento, a propósito, por alguns anos. Ele se foi. E ele não voltou para Antioquia. Aliás, Isso não se ajustaria bem à igreja antioquina que o enviara confiando que serviria aos dois pregadores. Assim, ele foi para Jerusalém.
Ele desaparece por alguns anos. A próxima vez que ele vai aparecer em cena é no capítulo 15 de Atos. Vá para o capítulo 15, versículo 36. Alguns anos se passaram. João Marcos não tem sido um problema nesse tempo, porque ele não estava por perto. Mas, Paulo não esqueceu de sua deserção, sua covardice, sua fraqueza. Paulo e Barnabé têm uma conversa, no versículo 36. Eles voltaram da primeira jornada. Eles deram o relatório completo do que Deus fez em sua primeira jornada missionária. O tempo passou.
Paulo, finalmente, diz a Barnabé depois de algum tempo: “Vamos voltar, visitar os irmãos em todas as cidades”. Essa seria a segunda viagem missionária, em que eles voltariam aos lugares onde fundaram as igrejas, onde proclamaram a Palavra de Deus. Barnabé queria levar João Marcos junto com eles também. Mas Paulo continuou resistindo a essa ideia, o que significa que Barnabé continuava insistindo.
Atos 15:38, diz: “Mas a Paulo parecia razoável que não tomassem consigo aquele que desde a Panfília se tinha apartado deles e não os acompanhou naquela obra.” E aqui o texto revela o que havia acontecido na outra viagem missionária, com relação a Marcos: ele se apartou. Essa é a única maneira de definir o que aconteceu. Não houve razão para sua partida, no capítulo 13. Marcos foi um desertor. Ele os abandonou na Panfília e não foi com eles para a obra.
A discussão entre Paulo e Barnabé – acerca de levarem ou não João Marcos com eles na próxima viagem missionária – ficou tão acalorada, que se tornou o que o versículo 39 chama de um forte desacordo, uma contenda aguda, de modo que a covardia de João Marcos não apenas fez com que ele tivesse seu relacionamento cortado com Paulo, mas causou a separação de Paulo de seu companheiro de obra, Barnabé.
Então, Barnabé levou Marcos com ele e viajou para Chipre, de onde ele era, para proclamar o evangelho lá. Paulo escolheu Silas para tomar o lugar de Barnabé e viajou – o versículo 41 diz – para a Síria e Selêucia, fortalecendo as igrejas. A recusa de Paulo em tomar João Marcos era legítima, correta. Ele não confiava nele. Marcos mostrou que não tinha coragem, força, compromisso. Ele foi um desertor.
Barnabé, aliás, viaja com João Marcos e desaparece por dois anos na narrativa bíblica. Não sabemos onde ele esteve nesses dois anos. João Marcos desaparece por dez anos na narrativa bíblica. Dez anos depois, ele aparece novamente. Vá para Colossenses 4. O nome dele aparece em uma carta escrita por Paulo à igreja de Colossos. A propósito, Paulo está em Roma quando escreve esta carta. Ele escreve a carta aos Colossenses quando esteve em Roma pela primeira vez como prisioneiro – lembrando que ele passou por duas prisões em Roma.
Ele foi preso a primeira vez e libertado, seguindo com seu ministério e, depois, foi preso em Roma pela segunda vez e foi martirizado. Mas a carta aos Colossenses se refere à primeira prisão. Dessa prisão em Roma Paulo escreveu três cartas: Efésios, Colossenses e Filemon. Vá ao capítulo 4, versículo 10: “Aristarco, que está preso comigo, vos saúda, e Marcos, o sobrinho de Barnabé, acerca do qual já recebestes mandamentos; se ele for ter convosco, recebei-o.” Uau! Dez anos depois, Paulo é prisioneiro em Roma e adivinha quem é seu companheiro? O desertor, Marcos!
Em sua carta a Filemon, versículos 23 e 24, Paulo diz: “Saúdam-te Epafras, meu companheiro de prisão por Cristo Jesus, Marcos, Aristarco, Demas e Lucas, meus cooperadores.” Aqui estamos dez anos depois. Paulo está em Roma. Marcos está em Roma com Paulo novamente. E Paulo diz: “Estou enviando Marcos em meu nome. Quando ele chegar aí vocês devem recebê-lo.” Assim, Marcos reconquistou a confiança de Paulo. Ele está de volta às boas graças de Paulo.
Quanto tempo durou esse relacionamento? Vá para 2 Timóteo. Essa carta Paulo escreveu de sua segunda prisão, alguns anos depois. E essa é a sua última carta, escrita entre 66, 67 d.C., vinte e dois, vinte e três anos desde o incidente da libertação de Pedro da prisão. Paulo sabia que sua morte estava próxima. Ele diz: “Estou pronto para ser morto. A hora da minha partida está próxima.” Ele foi decapitado nesse tempo. Mas, ele ainda pôde escrever essa última carta para Timóteo.
No versículo 9 do capítulo 4, Paulo diz a Timóteo: “Procura vir ter comigo depressa…”. Por quê? O verso 10 diz: “Porque Demas me desamparou, amando o presente século, e foi para Tessalônica…”, ou seja mais um desertor. Paulo estava sozinho não só por causa da deserção de Demas, mas porque Crescente tinha ido para a Galácia e Tito para a Dalmácia. Apenas Lucas estava com Paulo.
Então, ele diz a Timóteo, faça isso: “Pegue…” – Quem? – “…Marcos, e traze-o contigo, porque me é muito útil para o ministério.” Desde a primeira prisão, Paulo tinha Marcos ao seu lado. Alguns anos depois, em sua segunda prisão, à beira de sua morte, Paulo queria Marcos com ele. Assim, eu digo a você que esta é a história do desertor restaurado.
Que grande privilégio Marcos teve! Para um sujeito que não era apóstolo, nem profeta, nem pastor, nem professor, nem evangelista, nem líder, mas apenas um ajudante, deve ter sido um grande privilégio ter servido ao lado do apóstolo Paulo, desertando desse privilégio e sendo restaurado anos depois para se tornar tão intimamente associado a Paulo, tão amado por Paulo.
Paulo passou a confiar tanto em Marcos, a ponto de enviá-lo à igreja de Colossos como seu representante. E, quando Paulo está enfrentando a morte, no final de sua carreira, a única pessoa que ele pede para vir ter com ele, além de Timóteo, é Marcos. Você não está surpreso com isso, está? Surpreso com o fato de que o Senhor usaria pessoas assim? Mas esse é o único tipo de pessoas que existem para Deus usar: pecadores em recuperação, desertores restaurados, desertores recuperados.
Agora, essa parte da história é interessante, não é? O relacionamento de Marcos com Paulo é monumental. É empolgante imaginar um ajudante simples e humilde sendo um amigo íntimo e companheiro do grande apóstolo Paulo. Mas, o relacionamento de Marcos com outro apóstolo é muito mais significativo. Esse outro apóstolo é Pedro.
Certamente, já é o privilégio de todos os privilégios para um desertor, rejeitado por Paulo, ser restaurado na graça para se tornar o ajudante e amigo daquele homem maravilhoso, do próprio Paulo. Como Marcos poderia esperar esse tipo de honra? Mas, ele recebeu ainda mais do que isso. Ele se tornou o companheiro e homem de confiança de Pedro. Se Paulo é o maior apóstolo em termos do volume de escritos, Pedro era o amigo mais íntimo de Cristo. Que grande privilégio deve ter sido para Marcos passar anos ao lado de Paulo e anos ao lado de Pedro!
Marcos conhecia Pedro? Claro que sim. Pedro tinha ido à sua casa muitas vezes nos anos da igreja primitiva. Ele ouviu Pedro pregar? Com toda certeza. Mas não foi o seu conhecimento inicial de Pedro que foi tão significativo, mas o conhecimento posterior. Lembra daqueles dez anos em que João Marcos desapareceu? Parte desse tempo ele esteve com Pedro. Você se lembra que quando ele desertou, ele voltou para Jerusalém? Mas ele não ficou em Jerusalém. Pedro o levou para outro lugar.
Vá para 1 Pedro, capítulo 5, e eu direi para onde. Pedro escreve sua carta – que conhecemos como 1 Pedro – sua primeira epístola geral, e ele estava em Roma, quando escreveu esta carta. Ele está escrevendo em Roma para os crentes romanos e outras localidades. Ele faz referência a Roma no capítulo 5, versículo 13: “A vossa co-eleita em babilônia vos saúda…”. Essa é uma linguagem codificada, que significa “a igreja que está em Roma”. E a razão pela qual ele usa esse código é porque a perseguição havia estourado, severa perseguição mortal.
E assim, de maneira enigmática, Pedro substitui Roma por Babilônia, para não exacerbar a perseguição. As saudações se estendem da igreja em Roma às outras igrejas que lerão a carta. O texto continua: “…e meu filho Marcos também”. Meu filho Marcos? Oh, não seu filho físico, mas seu filho espiritual. Sem dúvida, Marcos havia chegado a Cristo ouvindo Pedro pregar quando ele era jovem. Sem dúvida, Pedro foi a primeira grande influência espiritual impactante em sua jovem vida.
Há um testemunho histórico consistente que remonta ao primeiro século, que nos informa que depois que Paulo deixou sua primeira prisão em Roma, depois de ter estado lá com Marcos, depois de ter escrito Efésios, Colossenses e Filemon, ele deixou Roma, foi libertado da prisão, voltando a ser preso mais tarde. Mas, no período intermediário, Pedro foi para Roma. O testemunho histórico consistente é que Pedro passou pelo menos um ano lá, talvez mais de um ano, pregando constantemente o evangelho dia após dia.
Pedro morreu em Roma como mártir no verão ou no outono do ano 64 dC, exatamente no tempo em que Nero incendiou a cidade e culpou os cristãos, iniciando uma dura perseguição contra a igreja. E enquanto Pedro estava lá, ele envia saudações e diz: “A vossa co-eleita em babilônia vos saúda, e meu filho Marcos.”. Logo, Marcos estava com Pedro em Roma. Você pode imaginar ser o companheiro do apóstolo Paulo? Isso já seria incrível. Mas, então, ser o companheiro de Pedro? E Marcos foi. Que privilégio surpreendente!
Pedro escreveu sua carta de Roma. E Marcos estava em Roma com Pedro. Você diz: “Por que isso é importante? Por que isso importa?” Bem, Porque o evangelho de Marcos é o produto do testemunho ocular de Pedro. A fonte de informação de Marcos, do ponto de vista humano, é Pedro. Seu Evangelho é baseado nos relatos de Pedro sobre a vida do Senhor Jesus, que Pedro lhe relatava dia após dia após dia, enquanto saía pelas ruas de Roma e pregava o evangelho com Marcos ao seu lado. E, acredite, Marcos já ouvira esses relatos antes, desde a infância.
O Evangelho de Marcos, assim, é o relato de Pedro através de João Marcos, que não era um apóstolo, nem um profeta, nem um pastor, nem um líder, nem um mestre (professor), mas apenas um ajudante. Ele recebe esse imenso e incrível privilégio de escrever o que ele chama de “Princípio do Evangelho de Jesus Cristo, Filho de Deus”, em Marcos 1:1. Sob a inspiração do Espírito Santo, que controlava todas as informações que chegaram a ele através de Pedro, ele escreveu este Evangelho.
Assim,temos Mateus, um ex-cobrador de impostos; Lucas, um gentio; João, um impetuoso filho do trovão; e Marcos, um desertor. E você pergunta: “Por que o Senhor escolheu essas pessoas?” Bem, porque esse é o único tipo de pessoa que existe. Pessoas pecadoras, não qualificadas, pecadores perdoados.
Você diz: “Mas temos certeza que João Marcos é o autor, já que o nome dele não está no Evangelho?” Sim, pois o testemunho universal da igreja que remonta ao primeiro século, no topo de cada Evangelho, nos manuscritos originais, lemos: Kata Mattaion, Kata Markon, Kata Lotkan, Kata Johannen, que traduzido é: de acordo com Mateus, de acordo com Marcos, de acordo com Lucas, de acordo com João. O título “de acordo com” remonta muito antes dos pais da igreja primitiva. A autoria dos Evangelhos foi inequivocamente afirmada, nunca contestada, nunca debatida. E os escritores antigos realmente dizem que Marcos escreveu o seu Evangelho a partir do que ouviu de Pedro.
De fato, é um testemunho maravilhoso. Alguém como Policarpo – um dos pais da igreja primitiva que conhecia João – teve um aluno chamado Papias, que escreveu: “Marcos, que era intérprete de Pedro, escreveu com exatidão.” Você tem Justino, que viveu de 100 a 150 d. C., em seu famoso Diálogo com Trifo fala das memórias de Pedro serem o Evangelho de Marcos.” Ele diz que Marcos escreveu em Roma após a morte de Pedro. Você tem Irineu, por volta do ano 200, Orígenes, por volta de 230, Clemente, no ano 300, Eusébio, 362, todos dizem a mesma coisa. Aqui está uma citação de Eusébio:
Uma luz religiosa tão grande brilhou nas mentes dos ouvintes de Pedro, que eles não ficaram satisfeitos com uma única audiência ou com o ensino não escrito da proclamação divina, mas rogaram a Marcos, cujo evangelho é uma extensão, visto que ele era seguidor de Pedro, para deixar por escrito um registro dos ensinamentos transmitidos a eles por via oral. Não cessaram até que tivessem prevalecido sobre o homem e, portanto, tornaram-se responsáveis humanamente pela Escritura que se chama ‘O Evangelho Segundo Marcos’.
Eles insistiram com Marcos para que escrevesse os ensinos que lhes foram transmitidos oralmente. Esta é a verdadeira obra autêntica de João Marcos, inspirada pelo Espírito Santo, protegida, controlada para ser uma revelação inerrante a respeito da vida, ministério, morte e ressurreição do Senhor Jesus Cristo. Mas é apenas o começo da história, apenas o começo.
E o Evangelho de Marcos inicia assim: “Princípio do evangelho de Jesus Cristo, o Filho de Deus”. O Evangelho de Marcos não possui um final, uma conclusão. Possui uma introdução, mas não uma conclusão. E, de fato, termina de uma maneira muito estranha. O final legítimo está no capítulo 16, versículo 8. É aí que realmente para. E para mostrar que o livro de Marcos tem começo, mas não uma conclusão, aqui está o último versículo de Marcos. Apenas ouça: “E, saindo elas apressadamente, fugiram do sepulcro, porque estavam possuídas de temor e assombro; e nada diziam a ninguém porque temiam.” Fim.
De fato, é um final tão estranho, que um final falso foi adicionado mais tarde, o que você verá entre parênteses na sua Bíblia. Os versos 9 a 20 de Marcos 16 não aparecem nos manuscritos mais antigos. Mas essa é uma característica consistente com Marcos. Ele traz o começo, mas não o fim, a história não tem fim. Se você quer saber o resto da história, vá para o livro de Atos.
O Evangelho de Marcos, então, foi escrito de Roma para os cristãos romanos. São as memórias de Pedro. Sabemos que foi escrito para os gentios, por causa de seu caráter gentio. Os temas judaicos são sempre explicados no decorrer do livro, porque os gentios não os entendiam. Veremos isso à medida que avançarmos. Não há genealogias no Evangelho de Marcos, porque os gentios não se preocupavam com uma genealogia judaica.
Existem latinismos por todo o livro de Marcos, porque os romanos falavam latim. Sempre que há um termo aramaico, é explicado, porque os romanos não falavam aramaico. Quando Marcos se refere ao tempo – capítulo 6, versículo 48, capítulo 13, versículo 35 – ele usa o padrão de hora romana. O estilo literário de Marcos é rápido como um relâmpago; sem introdução, sem conclusão. E o livro como um todo contém uma introdução, mas não uma conclusão.
O conteúdo do Evangelho de Marcos se concentra na ação, com poucas seções de ensino. Vemos ensino nos capítulos 4, 13, alguns pontos de ensino espalhados por aqui e por ali, mas principalmente o livro se concentra em ações, feitos. Foi escrito para ser lido originalmente em voz alta, diante dos ouvintes. O tema é Jesus Cristo, o Filho de Deus. A estrutura do livro é bem simples.
Há um ponto central no livro. Ele contém 16 capítulos. Vá para o meio, capítulo 8, versículo 29, e bem no meio do livro você ouve essa confissão de Pedro: “Tu és o Cristo”. Essa é a confissão máxima do livro. Tudo o que será dito depois, parte desse ponto. Tudo o que foi dito antes converge para esse ponto.. A primeira metade do livro prova que Jesus é o Cristo por Seus atos e palavras. A segunda metade prova que Jesus é o Cristo por Sua morte e ressurreição. Mas tudo se move em torno do centro do livro, de que Ele é o Cristo. O objetivo do livro é confessar que Jesus é o Cristo.
Ele tem o mesmo objetivo de João, que escreve em João 20:31: “Estes, porém, foram escritos para que creiais que Jesus é o Cristo, o Filho de Deus, e para que, crendo, tenhais vida em seu nome.”. É um livro evangelístico. A primeira metade está cheia de confusão, as pessoas estão confusas sobre o fato de quem Jesus era. De fato, as únicas pessoas que não estão confusas sobre Jesus na primeira metade de Marcos são os demônios. Na segunda metade, não há mais confusão sobre a identidade de Jesus, mas hostilidade.
O pináculo, então, do livro é a confissão de Pedro. E não é o que você esperaria de alguém que era discípulo de Pedro, que escreveu seu Evangelho a partir dos ensinos de Pedro? Ele usou a confissão de Pedro como centro de seu livro, confissão essa que Pedro deve ter lhe feito todos os dias em que ele estava com Marcos, quando ele pregava.
Pedro deve ter dito: “Eu creio que Ele é o Cristo, eu vou lhe contar a história. Um dia estávamos aqui e Jesus disse: ‘Quem os homens dizem que eu sou?’ E nós dissemos: uns dizem que o Senhor é Jeremias, um dos profetas’. E, de repente, do nada, eu disse: ‘Você é o Cristo, o Filho do Deus vivo’. Foi o que eu disse, e é no que eu creio.” Esse é o auge do testemunho de Pedro e o auge do Evangelho de Marcos.
E o objetivo do livro é levar todos nós a essa convicção. Que privilégio para este ajudante! A mais improvável das pessoas para algo tão grandioso! E Deus lhe deu privilégios além da conta para ser um companheiro íntimo de Paulo, um companheiro íntimo de Pedro, ajudando os dois. Mas além disso, dando-lhe o privilégio de escrever um dos quatro Evangelhos inspirados. Não subestime o que Deus é capaz de fazer com os meros ajudantes. Vamos orar.
Pai, agradecemos por este maravilhoso testemunho de Tua graça, que está ligado no coração deste homem em sua vida. Estamos empolgados por sermos seus alunos agora, à medida que embarcamos na história, como ele contou e como o Senhor o dirigiu. Somos tão abençoados, Senhor, tão abençoados por ter outra oportunidade de olharmos a vida de Cristo, de sermos apanhados na glória de Sua pessoa, de Sua obra, de Suas palavras, de Seus caminhos, de caminhar com Ele pelo mundo, ver Sua vida de outro ângulo.
Que privilégio! Cristo é tudo para nós, Ele é tudo para nós. Ele é a nossa vida. Agradecemos que vemos nesta justaposição entre o todo-glorioso Cristo e Marcos, uma distinção que faz parte de nossas próprias vidas. Aqui está um evangelho escrito sobre o Filho de Deus sem pecado por um homem pecador, escrito sobre o Filho de Deus forte, todo-poderoso e corajoso por um homem covarde e fraco. Aqui está a história de um sem pecado escrito por um pecador. Aqui está a história da justiça perfeita, escrita por um homem que precisa desesperadamente de graça. Senhor, nós te agradecemos pelo Senhor usar pessoas como nós, porque isso é tudo que existe, apenas pessoas pecadoras.
Obrigado por tão poderosa graça. Obrigado por, ao longo da História, ter usado ajudantes de maneiras tão surpreendentes. É um privilégio para nós, Senhor, sermos os beneficiários desta grande obra que Tu fizeste através deste homem notável. Não sabemos nada sobre ele. Sabemos o nome de sua mãe e que ele era um ajudante, um pecador recuperado que foi considerado útil. É tudo o que precisamos saber. É isso que desejamos. Restaura-nos, perdoa-nos, torna-nos úteis. Em nome do Teu filho. Amém.
Esta é uma série de sermões de John MacArthur sobre o Evangelho de Marcos.
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Este texto é uma síntese do sermão “Mark, the Restored Deserter”, de John MacArthur em 15/03/2009.
Você pode ouvi-lo integralmente (em inglês) no link abaixo:
https://www.gty.org/library/sermons-library/41-1/mark-the-restored-deserter
Tradução e síntese feitos pelo site Rei Eterno.