Por Que o Mal Domina o Mundo?

1. INTRODUÇÃO

Hoje vamos falar sobre o problema do mal. Por que Deus permitiu o mal no mundo? Você poderia enquadrar a questão de várias maneiras. Se o Deus Criador é soberano e tão bom, por que há tanto mal no mundo? De fato, a realidade do mal no mundo é uma das justificativas favoritas daqueles que rejeitam o Deus da Bíblia. Eles estão ansiosos para fazer essas perguntas de diversas maneiras, tais como: como Deus pode ser santo e permitir que Sua criação seja dominada pela falta de santidade? Como Deus pode ser perfeitamente justo e ordenar a presença da injustiça?

Há várias formas de se falar isto, mas todas têm a mesma essência. Uma é usando a lógica humana. É mais ou menos assim: “Se o Deus bíblico é bondoso, sábio, santo, justo, onisciente e todo poderoso, porém o mal domina o mundo, então o Deus bíblico não existe”. Ou seja, quem permite esse mal avassalador no mundo não pode ser amoroso, santo, justo, amoroso e todo poderoso.

Na mente de muitos, essas questões fazem com que os cristãos fiquem encurralados e desmoralizados, sem respostas convincentes. E muitos cristãos, sem argumentos bíblicos, fogem de tais questões simplesmente dizendo que “as coisas encobertas pertencem a Deus”, numa referência a Deuteronômio 29:29. Mas, será que isto é tudo o que podemos dizer sobre o assunto? Será que a Escritura não nos fornece informações que nos permitam responder efetivamente às acusações blasfemas?

Eu acredito que as Escrituras nos dão uma resposta e, sem hesitação. Podemos saber essa resposta, podemos entender essa resposta e podemos encontrar satisfação através dessa resposta. Não é suficiente simplesmente dizer que as coisas secretas pertencem ao Senhor, o que significa dizer que não sabemos, ou seja, que Deus não nos disse.

Deus não disse a Adão e Eva o motivo pelo qual Ele deixou a serpente entrar no Jardim. E Ele não lhes contou por que Ele deu para aquela serpente a capacidade de falar. Deus também não disse a Jó por que desencadeou calamidade, doenças, desastres, morte e Satanás em sua vida. E quando Jó tentou obter uma resposta de Deus, Ele nunca lhe disse o motivo. Se as questões fossem essas, não nos restaria nada mais a não ser dizer que não sabemos. Mas, quanto à questão da presença avassaladora do mal no mundo, a Escritura tem uma resposta.

A teodiceia, em face da presença do mal no mundo, procura defender e justificar a fé na onipotência e suprema bondade do Deus criador, contra aqueles que, em vista de tal dificuldade, duvidam de Sua existência ou perfeição. É uma defesa da justiça de Deus em face da presença de pecado generalizado. E então, eu quero lhe dar o que eu creio ser uma teodiceia fundamentada na Escritura, ou seja, uma defesa bíblica sobre o motivo pelo qual Deus, com todos os seus maravilhosos atributos, permitiu que o mal dominasse Sua criação.

2. PREMISSAS NECESSÁRIAS

É preciso definir algumas premissas importantes.

A) PRIMEIRA PREMISSA: O MAL EXISTE.

Isso é incontestável, a menos que você seja um defensor da herética Ciência Cristã. O ensinamento da Ciência Cristã é: “Todo mal é uma ilusão. Toda doença é uma ilusão. E até a morte é uma ilusão”. A Ciência Cristã é, na verdade, como um produto vendido nos supermercados, denominado “nozes de uva”, mas ele não tem nozes e nem uvas, ou seja, não é nenhuma coisa e nem outra. A Ciência Cristã não é nem cristã e nem científica.

A resposta não é fazer algum jogo metafísico ridículo para dizer que não existe algo que claramente existe. O mal existe. Existe aparentemente, manifestamente, massivamente, predominantemente em nosso mundo. E há várias categorias através das quais o mal manifesta sua existência. Deixe-me dar-lhe algumas:

Existe um mal natural, vindo de uma Terra que foi amaldiçoada. É um mal impessoal, externo, físico e temporal na forma de doenças, desastres, catástrofes, bactérias, ondas gigantescas, vírus, vulcões etc. etc. Todo o mundo natural pode ser destruído por coisas ruins, que te deixam doente, que te ferem, que te matam. E os humanos, desde a Queda, têm vivido à mercê da corrupção física. Tudo que você tem a fazer é voltar ao livro de Gênesis. Não muito depois da Queda, veio o Dilúvio, que basicamente foi um enorme desastre natural ordenado, criado e executado pelo próprio Deus, que afogou toda a raça humana, com a exceção de oito pessoas. E os desastres naturais são corriqueiros em nosso mundo.

Em segundo lugar, há o mal moral. Este é pessoal, interno e espiritual. É a maldade, o pecado, a transgressão, iniquidade, ou qualquer termo que você queira usar para isso. É uma tendência, uma disposição, uma atitude, é um curso de pensamento, fala e conduta que domina a raça humana. De modo que a Escritura diz: “Não há quem faça o bem, não há nem um só” (Romanos 3:12). Sobre a humanidade, Deus disse: “a maldade do homem se multiplicara sobre a terra e que toda a imaginação dos pensamentos de seu coração era só má continuamente” (Gênesis 6:5).

Jesus disse que é do coração do homem, ou seja, de seu interior, que vem o pecado (Marcos 7:21) e desse pecado vem a morte (Tiago 1:15). A Bíblia nos diz que o mundo é dominado pela corrupção. As calamidades e doenças produzem a morte, mas se escaparmos delas, a morte virá de qualquer forma por causa do pecado. A morte é o salário do pecado (Romanos 6:23). Toda a humanidade é composta de pecadores, ninguém é isento. A colisão de corações maus, egoístas e imorais conduz o mundo em conflitos e caos.

Então, em terceiro lugar, há o mal sobrenatural. Este é o mal que é basicamente perpetrado por demônios, anjos caídos, os associados de Satanás. Um terço dos anjos caiu. Satanás é um desses e o mundo inteiro está no maligno (I João 5:20). Esses seres desprezíveis são tão antigos quanto a criação. Eles são totalmente iníquos. Não há nada neles que seja bom. E terrível será quando Satanás tiver autoridade temporária no tempo da grande tribulação. Há uma enorme luta espiritual acontecendo neste sistema mundial efetuada por demônios. Eles têm o poder de seduzir e enganar a humanidade contra Deus, contra o evangelho e contra a Escritura. Eles conduzem o mundo para a imoralidade e iniquidade.

E então, há outra categoria do mal: o mal eterno, ou seja, o inferno. As pessoas ali serão eternamente más. E será a maioria da humanidade. Lá o verme não morrerá, o fogo não se apagará, o remorso não terminará, o julgamento não cessará, a punição não será suavizada. O inferno é o castigo eterno. E muitos cristãos se sentem desconfortáveis em falar sobre o inferno como a Bíblia o descreve. É o mal desenfreado e absoluto, e uma consciência acusadora plenamente informada.

Sim, existe o mal. Não há um mal proporcional, há um mal predominante e dominante. E eu acho que você poderia dizer que o mal tem uma espécie de domínio secundário em toda a criação. Ele afeta tudo. Ele afeta a criação natural, a criação sobrenatural e a criação humana e pessoal.

Então, começamos com o óbvio. Nós admitimos e não negamos a existência do mal, tal como a Escritura o descreve. Qualquer um que negue isso é um idiota absoluto. O mal é massivo, o mal está fora de controle, o mal está arraigado, é sistêmico, está em toda parte, todo o tempo, manifestado em cada um.

B) SEGUNDA PREMISSA: DEUS EXISTE. E EXISTE APENAS UM DEUS.

Ele é o Deus revelado nas Escrituras, o único e verdadeiro Deus vivo, o Deus da Bíblia. Ele é exatamente o Deus que as Escrituras dizem que Ele é, visto que a Bíblia é Sua autorevelação. Ele é como as Escrituras O descrevem. Ele é todo-poderoso, onisciente, amoroso e absolutamente santo. A Bíblia nos diz que Deus existe e que nada existe que Ele não ordene. Nada ocorre que Ele não ordene. Tudo é projetado, ordenado e controlado por Deus. Esse é o testemunho bíblico. Vejas essas porções bíblicas:

Tua é, SENHOR, a magnificência, e o poder, e a honra, e a vitória, e a majestade; porque teu é tudo quanto há nos céus e na terra; teu é, SENHOR, o reino, e tu te exaltaste por cabeça sobre todos. E riquezas e glória vêm de diante de ti, e tu dominas sobre tudo, e na tua mão há força e poder; e na tua mão está o engrandecer e o dar força a tudo (I Crônicas 29:11-12).

Mas o nosso Deus está nos céus; fez tudo o que lhe agradou (Salmo 115:3).

Todos os moradores da terra são por ele reputados em nada; e, segundo a sua vontade, ele opera com o exército do céu e os moradores da terra; não há quem lhe possa deter a mão, nem lhe dizer: Que fazes? (Daniel 4:35)

A Escritura afirma repetidamente a soberania de Deus sobre tudo. A soberania de Deus é absoluta, irresistível e infinita. Quando dizemos que Deus é soberano, simplesmente queremos dizer que Ele tem o direito de estar absolutamente no governo de tudo, porque Ele, de fato, está absolutamente governando tudo. I Timóteo 6:15 diz que Deus é “bendito e único Soberano, o Rei dos reis e Senhor dos senhores”. Apocalipse 4:11 diz:

Tu és digno, Senhor e Deus nosso, de receber a glória, a honra e o poder, porque todas as coisas tu criaste, sim, por causa da tua vontade vieram a existir e foram criadas.

Tudo se encaixa no prazer de Deus. Tudo é para agradar a Deus. Provérbios 16:4 diz que “o Senhor fez todas as coisas para atender aos seus próprios desígnios, até o ímpio para o dia do mal”. Até os ímpios para o dia do mal. Veja esses textos:

Vede agora que eu, eu o sou, e mais nenhum deus há além de mim; eu mato, e eu faço viver; eu firo, e eu saro, e ninguém há que escape da minha mão (Deuteronômio 32:39).

E disse-lhe o Senhor: Quem fez a boca do homem? ou quem fez o mudo, ou o surdo, ou o que vê, ou o cego? Não sou eu, o Senhor? (Êxodo 4:11)

As Escrituras são muito claras de que Deus está por trás daquilo que classificamos como coisas boas e do que classificamos como coisas más, ou coisas ruins. Deus criou a partir de Sua livre escolha, sem ser influenciado. Deus criou e ordenou tudo. Veja esses textos: 

Porque falou, e foi feito; mandou, e logo apareceu. O Senhor desfaz o conselho dos gentios, quebranta os intentos dos povos. O conselho do Senhor permanece para sempre; os intentos do seu coração de geração em geração (Salmo 33:9-11).

O Senhor tem estabelecido o seu trono nos céus, e o seu reino domina sobre tudo (Salmo 103:19).

Porque o Senhor dos Exércitos o determinou; quem o invalidará? E a sua mão está estendida; quem pois a fará voltar atrás? (Isaías 14:27).

Lembrai-vos das coisas passadas desde a antiguidade; que eu sou Deus, e não há outro Deus, não há outro semelhante a mim. Que anuncio o fim desde o princípio, e desde a antiguidade as coisas que ainda não sucederam; que digo: O meu conselho será firme, e farei toda a minha vontade (Isaías 46:9-10).

O Senhor é o que tira a vida e a dá; faz descer à sepultura e faz tornar a subir dela. O Senhor empobrece e enriquece; abaixa e também exalta (I Samuel 2:6-7).

Deus controla absolutamente tudo. Não há mal fora de seu plano. Não há mal fora do Seu propósito. Ele sabe tudo o que pode ser conhecido. Ele tem um poder abrangente para fazer tudo. É isso que a Bíblia diz sobre Deus. E naquele Seu perfeito conhecimento, perfeito poder, perfeita santidade e perfeito amor, Deus ordena tudo.

C) TERCEIRA PREMISSA: DEUS QUER QUE O MAL EXISTA.

O mal existe, Deus existe e é único. Logo, Deus quer que o mal exista. Não ha como fugirmos dessa conclusão. Isaías 45 é importante. Veja os versos 5-11:

5 Eu sou o SENHOR, e não há outro; fora de mim não há Deus; eu te cingirei, ainda que tu não me conheças;
6 Para que se saiba desde o nascente do sol, e desde o poente, que fora de mim não há outro; eu sou o Senhor, e não há outro.
7 Eu formo a luz, e crio as trevas; eu faço a paz, e crio o mal; eu, o Senhor, faço todas estas coisas.
8 Destilai, ó céus, dessas alturas, e as nuvens chovam justiça; abra-se a terra, e produza a salvação, e ao mesmo tempo frutifique a justiça; eu, o Sennhor, as criei.
9 Ai daquele que contende com o seu Criador! o caco entre outros cacos de barro! Porventura dirá o barro ao que o formou: Que fazes? ou a tua obra: Não tens mãos?
10 Ai daquele que diz ao pai: Que é o que geras? E à mulher: Que dás tu à luz?
11 Assim diz o Senhor, o Santo de Israel, aquele que o formou: Perguntai-me as coisas futuras; demandai-me acerca de meus filhos, e acerca da obra das minhas mãos.

Este texto gera pânico na cabeça daqueles que querem subtrair a plena soberania de Deus em todos os assuntos da criação, inclusive da salvação. Eles dizem: “O que? Deus ordenou o mal? Deus não pode ser responsabilizado pelo mal!”. E assim, eles se insurgem contra a mensagem dos reformadores. A teologia arminiana, predominantemente aceita no cristianismo moderno, se opõe às doutrinas da graça e da soberania de Deus e responsabilidade do homem caminhando juntas.

Essa teologia diz que o homem é soberano, responsável por sua própria vida, faz suas próprias escolhas, torna-se um pecador por conta própria, exerce fé por conta própria, é salvo por méritos próprios de arrependimento e que também cabe ao homem manter-se salvo por seus esforços. Essa é uma forma de tentar isentar Deus da responsabilidade do que ocorre ao longo da História.

Eu realmente penso que a teologia arminiana, na maioria das vezes, é um dispositivo para tirar Deus de cena. E como eles fazem isso? Bem, a linha de fundo é que Deus não é responsável pelo mal, mas que você é. Isso realmente não ajuda a tirar Deus de cena, porque foi Deus quem criou as criaturas que seriam responsáveis pelo mal, sabendo que elas praticariam o mal. A responsabilidade final vai para Deus, de qualquer forma. Como resolver isto? Uma tentativa é dizer que o mal vem daqueles que não querem Deus. Mas, isto é o mesmo que dizer que Deus não tinha o conhecimento de que o mal existiria ou que Deus não tem o poder de lidar com ele.

Enfim, dessa má teologia podemos concluir que Deus, em Sua criação, fez tudo perfeito e não sabia sobre a existência futura do mal, e assim Ele foi pego de surpresa. Ou que Deus sabia que o mal viria, mas não tinha o poder de impedi-lo ou escolheu não usar o poder porque Ele tinha algo ainda mais importante que o mal, algo de maior valor em vista. Esses tipos de ideias surgem para supostamente tirar Deus de cena, ou seja, eximi-Lo de qualquer responsabilidade acerca da existência e permanência do mal no mundo. Mas, o que eles de fato fazem é reinventar Deus. Você reinventa um Deus que não é onisciente. Você reinventa um Deus que não é todo-poderoso. Essa é a única saída e é por isso que esse tipo de teologia existe.

Mas, vamos seguir adiante. A herética teologia do processo reinventou Deus como uma divindade em progresso. Essa teologia diz que Deus não sabia que o mal viria e que não pode ser responsabilizado por ele. E que Deus está aprendendo a cada dia. Hoje Ele sabe mais que ontem. Essa teologia diz que Deus não é onisciente, então quando o mal apareceu, Ele teve que criar o Plano B, que seria a cruz. Seus defensores dizem que os horrores das guerras e dos genocídios exigem uma revisão radical das noções acerca do poder e soberania de Deus. Para eles, a teologia cristã deve ser atualizada e revisada em cada nova cultura, à luz de seus interesses, questões e dúvidas específicas.

Bem, você entendeu? São pessoas que não têm uma visão verdadeira e bíblica acerca de Deus. Eles olham para as coisas a partir de uma visão centrada no homem e precisam ter certeza de que Deus não viola nenhuma de suas regras. Eles não concebem a ideia de que Deus sempre tem pleno conhecimento do mal e poder de impedi-lo, porque se assim concebessem, teriam que admitir que Ele ordenou o mal. Isso é mais do que um arminiano pode suportar. E assim, para os que não creem no que as Escrituras afirmam sobre a soberania de Deus, ou Ele não tem o conhecimento, ou Ele não tem o poder. E então, reinventaram Deus.

Existem pessoas que não são tão sofisticadas assim, que fornecem apenas respostas curtas a estas questões relativas ao mal. Você diz: “De onde veio o mal?” E eles dirão: “Oh, veio de Adão e Eva”. Mesmo? Como o mal foi introduzido em Adão e Eva? “Bem, oh sim, isso mesmo, veio da serpente”. Bem, como é que a serpente chegou a uma situação de manifestar Satanás? E como Satanás tornou-se maligno e tentando as pessoas a fazer o mal? “Oh bem, ele veio do céu, não veio?”.

Então, onde o mal se originou? O mal se originou onde? No paraíso? Sim, o mal se originou no céu em uma rebelião angélica bem debaixo do nariz de Deus. Você ficou chocado com essa informação? Para fugir dela, as pessoas preferem não crer que Deus seja absolutamente onisciente e todo poderoso. Não importa como você lide com isso, se você crê no que a doutrina bíblica diz a respeito de Deus, Ele se torna responsável pela existência do mal. Mas, muitos que dizem crer na Bíblia querem arrastar Deus para um tribunal humano para ser julgado pela razão humana.

Agora, quando você reduz tudo isso, há várias categorias nas quais as teodiceias podem ser criadas. Deixe-me apenas apresentar isso a você. Esta é uma pequena aula de seminário, pessoal, aguente firme. A primeira categoria é a metafísica. Isso quer dizer que o mal é inevitável. É um corolário, uma consequência oposta ao bem. É necessário. É o “Yin Yang”. É um oposto necessário de algo que existe e que, pela própria metafísica de sua existência, o oposto também pode existir. Não é que Deus tenha criado o mal. Não é que Deus tenha ordenado o mal. É que o mal existe porque o bem existe. Assim como só podemos conceber algo infinito se contrastarmos com a finitude, só podemos conceber o bem em contraste com o mal. Há alguma verdade nisso em algum grau.

Há outra abordagem mais teológica dessa concepção. Segundo ela, Deus criou a humanidade boa, o potencial para o mal existia dentro dessa criação e o homem exercendo sua vontade escolheu o mal. Então, o mal não veio realmente de Deus, veio do homem, de Lúcifer, que fez a mesma escolha no céu. Esse foi o argumento de Agostinho e Tomás de Aquino nos tempos antigos. E há verdade nisso. Existe a santidade de Deus e existe a pecaminosidade da criatura. Mas, se o bem existe e o mal deve existir, isso teria que ser perpetuamente verdadeiro, mesmo na eternidade?

Há ainda outro tipo de teodiceia. Esta é a categoria que sugere que a causa do mal é o abuso do livre arbítrio. E, novamente, voltamos ao arminianismo. Essa concepção basicamente diz que o maior bem para Deus é o livre arbítrio. O livre arbítrio supera tudo na escala de Deus. Deus poderia ter evitado o mal, mas Ele queria que o livre-arbítrio existisse e, portanto, o mal existe porque aquelas criaturas livres e autônomas escolhem o mal.

E porque o livre-arbítrio era mais importante para Deus como uma realidade do que a eliminação do mal, o mal existe. O mal existe porque Deus exalta o livre- arbítrio. O livre-arbítrio supera o mal na escala de valores de Deus, de modo que Deus teve que admitir a possibilidade do mal, a fim de preservar a autonomia mais valorizada que o protege da injustiça. Novamente, o ponto principal é que você não pode responsabilizar Deus por nada, então o maior bem da criação é o livre-arbítrio. Até mesmo os anjos teriam livre-arbítrio, pelo menos inicialmente. Se Deus age como uma causa primária para as escolhas das pessoas, elas não seriam livres. Então, o bem maior é o livre-arbítrio. Deus tem que respeitar isso para ser justo. Ou seja, essa doutrina faz de Deus um ser que valoriza tudo acima se Si mesmo. Esse não é o Deus da Escritura.

E, de qualquer maneira, se Deus sabia que as pessoas escolheriam o pecado e o inferno, por que Ele foi em frente e as criou, então? E por que Ele teria projetado o livre arbítrio para resultar em um mundo tomado pelo mal? Então, aqui temos mais uma tentativa de negar o envolvimento direto de Deus como Ele é revelado no Antigo Testamento. Isto não resolve nenhum problema e serve apenas para diminuir a glória de Deus.

Projetar um Deus com conhecimento limitado, com poder limitado ou um Deus que esteja mais preocupado com a vontade de cada ser humano do que com Sua própria vontade é projetar um Deus que não é o Deus bíblico. Se Deus não está no controle total do mal, se Ele não o ordenou, ouça, e se Ele não o tem sob controle total a cada milissegundo da História, então este Universo está fora do controle de Deus.

Você preferiria ter um Deus tentando obter o controle do mal ou um Deus completamente no controle dele? Faça sua escolha. Mas o Deus da Bíblia tem o completo controle do mal para Seus próprios propósitos. É realmente heresia dizer que o mundo está cheio do mal à parte de um plano e propósito predeterminados por Deus, que está muito acima das escolhas arbitrárias das pessoas.

D) QUARTA PREMISSA: O MAL NO PROPÓSITO DE DEUS.

Então, o que sabemos até agora? O mal existe. Deus existe. Deus quer que o mal exista. Ele não criou o mal, mas Ele não impediu de o mal vir à existência. Ele o ordenou. Ele quis. E, ouça atentamente, porque Ele tinha um propósito para isto. Isso é crítico. Ele tinha um propósito para o mal.

Qual é esse propósito que Deus tinha para o mal? Antes de responder a essa pergunta, deixe-me ler um trecho da Confissão de Westminster (1643-1646):

Desde toda a eternidade, Deus, pelo muito sábio e santo conselho da sua própria vontade, ordenou livre e inalteravelmente tudo quanto acontece, porém de modo que nem Deus é o autor do pecado, nem violentada é a vontade da criatura, nem é tirada a liberdade ou contingência das causas secundárias, antes estabelecidas.

Pela Sua muito sábia providência, segundo a Sua infalível presciência e o livre e imutável conselho da Sua própria vontade, Deus, o grande Criador de todas as coisas, para o louvor da glória da Sua sabedoria, poder, justiça, bondade e misericórdia, sustenta, dirige, dispõe e governa todas as Suas criaturas, todas as ações e todas as coisas, desde a maior até a menor.

E a confissão está correta. A razão para Deus ordenar o mal é para o louvor da Sua glória. Deixe-me fazer uma pergunta simples: Deus é mais glorioso por causa do pecado existente ou a presença do pecado tornou Deus menos glorioso? Paulo Pergunta: “E, se a nossa injustiça demonstra a justiça de Deus, que diremos?” (Romanos 3:5).

Note o que Paulo disse: “A injustiça demonstra a justiça de Deus”. A palavra traduzida como “demonstra”, no grego, significa “divulgar, revelar, colocar em exibição, mostrar”. Nossa injustiça demonstra a justiça de Deus. Outra maneira de dizer isso seria: “Você realmente entenderia a justiça de Deus se não entendesse a injustiça?”. O contraste entre luz e trevas exibe a glória da luz.

Paulo mostrou que Deus é fiel às Suas promessas a Israel, e que o pecado e a incredulidade de Israel não podem alterar a aliança e a fidelidade de Deus. Deus é justo. Deus fará o que Ele disse por Israel. E até mesmo a injustiça de Israel não pode anular a justiça de Deus, mas dá a Ele oportunidade de demonstrar essa justiça. A injustiça de Israel não prejudica a verdade de Deus ou a glória de Deus. Assim, em um caso particular em relação a Israel, a injustiça deles tornou a justiça de Deus ainda mais gloriosa. E, em geral, a injustiça apenas torna a justiça mais maravilhosa. E assim Deus ao permitir a injustiça, está demonstrando justiça.

Vá para Romanos 5:8, e a palavra “demonstra” aparece novamente. “Mas Deus prova (ou demonstra) o seu próprio amor para conosco pelo fato de ter Cristo morrido por nós, sendo nós ainda pecadores”. Nós entenderíamos justiça sem injustiça? Nós entenderíamos amor sem pecado? Será que nós entenderíamos o amor de Deus em Cristo por nós se não entendêssemos quão pecaminosos, indignos e miseráveis nós somos? Será que entenderíamos o significado dos sofrimentos de Jesus Cristo na cruz por nós? A cruz é a maior demonstração do amor de Deus, é uma exibição massiva do amor de Deus para miseráveis pecadores como nós. Sermos pecadores e inimigos permite que Deus coloque o Seu amor em exibição aberta.

Então, Paulo diz que Deus demonstra a Sua justiça em um contexto de injustiça. Deus demonstra Seu amor em um contexto de ódio. Vá para Romanos 9:22-23, e então Paulo mais uma vez usa a palavra ‘demonstrar’:

Que diremos, pois, se Deus, querendo mostrar a sua ira e dar a conhecer o seu poder, suportou com muita longanimidade os vasos de ira, preparados para a perdição, a fim de que também desse a conhecer as riquezas da sua glória em vasos de misericórdia, que para glória preparou de antemão.

Esses versículos não pretendem identificar a origem do mal ou explicar por completo por que Deus o permitiu. Mas eles mostram que Deus permitiu o mal para demonstrar Sua ira, tornar Seu poder conhecido e para evidenciar a riqueza de Sua misericórdia gloriosa. E fazendo isso, Ele colocou Sua santidade em exibição.

Se não fosse o pecado, não teríamos como perceber a santidade, a justiça e o amor de Deus. Deus permitiu o pecado para que Ele pudesse exibir Sua ira sobre o pecado, Seu juízo sobre os pecadores. E isto não seria possível sem o pecado. “Ele suportou com muita paciência vasos de ira preparados para a destruição”. Foi algo que Deus teve que suportar. Sua natureza sagrada teve que suportar isso. Ele suportou pacientemente para que no final pudesse exibir Sua ira e Seu poder eterno e pleno. E também “a fim de que também desse a conhecer as riquezas da sua glória em vasos de misericórdia, que para glória preparou de antemão”.

Ouça, toda a razão pela qual Deus ordenou que o mal existisse foi para a Sua própria glória, para que anjos santos e os santos redimidos para sempre e sempre dessem glória a Ele em plena compreensão de todos os Seus atributos. Antes do pecado, Deus não foi completamente adorado por Sua justiça, pois não havia a injustiça. Ele não foi completamente adorado por Seu amor, pois ele não havia sido exibido aos pecadores inimigos e rebeldes. Ele não foi completamente adorado por Sua santidade, até que Sua ira demonstrou como Ele odeia o pecado. E Ele não foi adorado por Sua graça, até que Ele mostrou perdão e misericórdia aos eleitos. Em todo caso, existe essa grande revelação da natureza de Deus. Por quê? Para exibir Sua glória.

Paulo nos dá uma demonstração disso. Volte para o versículo 17 de Romanos 9, que diz: “Porque a Escritura diz a Faraó: Para isto mesmo te levantei, para mostrar em ti o meu poder e para que o meu nome seja anunciado por toda a terra”. Paulo está se referindo a Êxodo 9:16, onde Deus diz a Faraó: “para isto te mantive, para mostrar meu poder em ti, e para que o meu nome seja anunciado em toda a terra”. Em outras palavras: “você é o faraó porque Eu determinei que você seria o faraó, para que Eu pudesse mostrar o meu poder em você e o meu nome fosse declarado em toda a Terra”. Esse Faraó foi colocado no poder por Aquele que controla a História. E assim, aquele faraó esteve no palco da maior demonstração do Antigo Testamento do poder redentor de Deus. A páscoa judaica celebra a libertação dos hebreus do Egito. Esse é o referencial de redenção do Antigo Testamento. Deus levantou Faraó para mostrar a Sua ira e graça.

Deus faz tudo para a Sua própria glória e Ele foi glorificado em toda a terra pelo Seu povo e Ele estará na terra milenar e no novo céu e na nova terra. O bem maior, queridos, é a glória de Deus. O maior bem é a glória de Deus. E se você não entende isso, então você não tem uma visão de mundo centrada em Deus.

Então, como respondemos a isso? Volte para os versículos 13-15 de Romanos 9, que dizem:

13 Como está escrito: Amei Jacó, porém me aborreci de Esaú.
14 Que diremos, pois? Há injustiça da parte de Deus? De modo nenhum!
15 Pois ele diz a Moisés: Terei misericórdia de quem me aprouver ter misericórdia e compadecer-me-ei de quem me aprouver ter compaixão.

O que Paulo está dizendo é: Você está lutando com isso? Você está dizendo que não parece justo? Ele responde: “De modo nenhum!!”. Não podemos acusar Deus de ser injusto. Ele tem o direito de fazer o que Ele quer. Ele tem piedade de quem Ele quer e tem misericórdia de quem Ele quer. O verso 16 diz: “não depende de quem quer ou de quem corre, mas de usar Deus a sua misericórdia”. O verso 18 diz: “Logo, tem ele misericórdia de quem quer e também endurece a quem lhe apraz”.

Você diz: “Então, por que Ele ainda acha culpa, se ninguém resiste à Sua vontade?”. Os versos 20-21 dizem:

20 Quem és tu, ó homem, para discutires com Deus?! Porventura, pode o objeto perguntar a quem o fez: Por que me fizeste assim?
21 Ou não tem o oleiro direito sobre a massa, para do mesmo barro fazer um vaso para honra e outro, para desonra?

Você está esquecendo quem está no comando? O verso 23 diz: “a fim de que também desse a conhecer as riquezas da sua glória em vasos de misericórdia, que para glória preparou de antemão”. Não há outra explicação. Isso me faz lembrar de Jó.

Jó teve enfrentou terríveis problemas que Deus permitiu entrar em sua vida. Satanás desceu, matou todos em sua família, exceto sua esposa, que era um peso naquele momento. Ela lhe disse para amaldiçoar a Deus e morrer. Jó perdeu tudo que possuía e foi tomado por doenças terríveis. Ele ganhou um monte de amigos estúpidos que lhe deram más respostas e uma péssima teologia. Jó estava tentando descobrir o que estava acontecendo. E ele queria uma resposta de Deus. Nada lhe parecia certo, não parecia justo. E Deus, finalmente, fala com ele em Jó 38:1, que diz: “Quem és tu que escurece o conselho com palavras sem conhecimento?”. Que introdução!

E, diante dos resmungos de Jó, Deus diz: “cinge os teus lombos, como homem; e perguntar-te-ei, e tu me ensinarás”. Deus não dá nenhuma explicação a Jó sobre seus sofrimentos, e pergunta: “Onde estavas tu, quando eu fundava a terra? Faze-mo saber, se tens inteligência”. E Deus prosseguiu em muitas perguntas que produziram o silêncio total em Jó.

No verso 2, do capítulo 40, Deus diz: “Acaso, quem usa de censuras contenderá com o Todo-Poderoso? Quem assim argui a Deus que responda”. O que restou a Jó dizer: “Sou indigno; que te responderia eu? Ponho a mão na minha boca”. E Deus diz a Jó:

7 Cinge agora os lombos como homem; eu te perguntarei, e tu me responderás.
8 Acaso, anularás tu, de fato, o meu juízo? Ou me condenarás, para te justificares?

E Jó termina dizendo:

2 Bem sei que tudo podes, e nenhum dos teus planos pode ser frustrado.
3 Quem é aquele, como disseste, que sem conhecimento encobre o conselho? Na verdade, falei do que não entendia; coisas maravilhosas demais para mim, coisas que eu não conhecia.
4 Escuta-me, pois, havias dito, e eu falarei; eu te perguntarei, e tu me ensinarás.
5 Eu te conhecia só de ouvir, mas agora os meus olhos te veem.
6 Por isso, me abomino e me arrependo no pó e na cinza.

Jó entendeu que Deus tem todo o direito de colocar Sua glória em plena exibição. E o mal faz isso acontecer. Gastaremos a eternidade na presença de Deus O exaltando de maneira tão gloriosa, algo que nunca seria possível sem a existência do mal, muito embora Deus não tenha criado o mal e nem é a fonte dele. E no tempo perfeito, tudo estará terminado e Ele destruirá todo este Universo em um holocausto descrito por Pedro como elementos se fundindo com calor ardente. E haverá a criação de um novo céu e uma nova terra em que só existirá justiça eterna. Nós O adoraremos para sempre com uma compreensão da plena manifestação da Sua glória.

Vamos orar.

Pai, agradecemos pela revelação de Tua Palavra. Tu nos revelaste nela o porquê do mal. Não é um mistério. É o Senhor dizendo: “Eu sou Deus, faço o que faço para minha própria Glória”. E como é maravilhoso que Tu tenhas nos escolhido para fazermos parte daquela eterna Assembleia que vai Te dar Glória e que cantará louvores para o Cordeiro que foi morto. Agradecemos-Te pelo poder que há na verdade. Ajuda-nos a ajudarmos os outros, para respondermos a estas profundas perguntas com a simples revelação que o Senhor nos tem dado. Estamos em temor, Deus, porque nos escolheste para sermos uma parte da comunidade de resgatados que vai compreender para sempre a glória que veio e foi totalmente exibida por causa do pecado. Que privilégio o nosso. Agradecemos em nome de Cristo. Amém.

Leia também: A Origem do Mal


Este texto é uma síntese do sermão “Why Does Evil Dominate the World?”, de John MacArthur em 04/03/2007.

Você poderá ouvi-lo integralmente (em inglês) no link abaixo:

https://www.gty.org/library/sermons-library/90-333

Tradução e síntese feitos pelo site Rei Eterno


 

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