Uma satisfação incondicional
Apesar de nossos melhores esforços, a vida nunca é suficientemente boa. Nossos padrões nunca são atingidos. Até mesmo as vidas mais felizes têm bolsões de dor sem cura. Quando enfrentamos este fato, acontece algo importante. Perdemos o fôlego na tentativa de fazer a vida dar certo; vamos um pouco mais devagar e ficamos abertos a mudanças de direção.
Quando nos tornamos conscientes da dor incurável que sofremos, clamamos a Deus em ira e tristeza: “cura a nossa dor! Livra-nos dos inimigos! Mas nem sempre Deus responde como queremos, e finalmente nos inclinamos, exaustos, exauridos da energia que precisávamos para enfocar o alívio de nossa própria dor”.
Enquanto a exaustão nos imobiliza e perdemos o interesse em melhorar as coisas, somos libertos para buscar a Deus. Agora não mais desesperamos com a busca de soluções de Deus; buscamos comunhão com Deus. Consciência do que é verdade sobre nós, sobre a vida e sobre Deus nos faz calar e ver, envergonhados, a futilidade de tentar fazer as coisas dar certo na vida. Por que nos preocupar? Não vale a pena. Nada que eu faça dará o que minha alma mais almeja.
Encontramo-nos reduzida a inércia, parados, nus perante Deus. Sem poder de melhorar nossas próprias vidas, nos agachamos, cheios de medo e terror porque ele recusa ser controlado por nós. Pelo contrário, ele diz “Aquietai-vos, e sabei que eu sou Deus” (Sl. 46:10).
Com dor além das lágrimas, a espécie de dor conhecida apenas por pessoas que estão quietas, percebemos o quanto desejamos sentir o gosto de Cristo, como almejamos que Deus permita que o encontremos. Com um desejo além das palavras gememos com a intensidade do desejo, prostrados sob o céu frio, com medo de olhar para cima, por um momento esperando que Deus nos deixe em paz na nossa desgraça, para não nos destruir com sua presença, e, no próximo, esperando contra a esperança que ele nos revele o seu coração de amor misericordioso. Os minutos passam. Às vezes passam-se anos. E ficamos prostrados, quietos.
Mais de uma vez, tenho me levantado às duas da madrugada, sem conseguir ficar deitado por causa de pensamentos de ira e terror. As vezes isso começa de forma inocente, talvez lembrando de uma data limite para pagar impostos ou uma palestra que ainda não preparei e terei que dar na próxima Quarta feira.
Então, como uma bola de bilhar bate em outra, aquele pensamento provoca outros: telefonemas a serem dados, tensões com as quais lidar, correspondência a responder, decisões difíceis que não podem mais serem adiadas. Suo frio. Um pavor estranho que parece ter como fonte, mais do que as responsabilidades me cobre. A vida parece difícil demais. Não consigo cumprir suas exigências.
Fico furioso quando qualquer pessoa exige algo de mim. Por que não me dão trégua? Com resignação fumegante reconheço que ninguém o fará, nem mesmo Deus. Ele não vai fazer minha declaração de impostos por mim.
Corro para me recuperar. Preparo minha estratégia. Amanhã eu junto os recibos do ano passado e vou fazer o esboço de minha palestra após atender os três pacientes marcados. Talvez eu cancele as consultas. Não, isso seria irresponsável de minha parte. Mas estou premido pelo tempo. Eles vão ter que entender.
Certa manhã há alguns meses, após me debater com pensamentos assim, fiquei ao pé de minha cama, sem me mexer por uns dez minutos. Finalmente uma câimbra na perna me fez voltar a cama onde permaneci, incapaz de dormir, por mais de uma hora. Deus, onde você está? O que é que está fazendo? Não está vendo que eu estou em desespero? De que me adianta o Senhor? Não ouvi resposta. Finalmente dormi, de tão exausto, desejando de todo o coração ouvir a Deus.
ESTADO DE ALERTA
Enquanto estamos prostrados, sem nos debater para reavivar nossos espíritos o suficiente para levantar e continuar a vida, ouvimos nova voz; um sussurro, a princípio, mas mais clara e mais real do que qualquer voz jamais ouvida. Ela nos chama à oração, a nos alimentar da palavra de Deus, a imaginar que logo nossos sonhos mais arrojados se tornarão realidade.
Aquela madrugada, alguns meses atrás. Trouxe-me algo parecido com um reavivamento. Acordei do sono inquieto, ainda sentindo-me incapaz. Sem energia. Como uma marionete puxada por cordas, consegui sair da cama e cambalear até o box do chuveiro.
Uma coisa eu sabia. Sem conhecer profundamente a Deus eu não teria forças ou razão para nada. Estava encurralado por Ele.
Enquanto tomava banho, o pensamento veio como um tapa: outros passam por sofrimentos semelhantes ao meu, alguns muito piores. Muitos já perseveraram e permaneceram fiéis. Outros ainda têm muito a enfrentar. Talvez eu pudesse receber forças dos que estão adiante de mim, e tornar-me fonte de força para os que ainda estão atrás.
Naquele momento eu sorri, se é verdade, pensei, existe razão para cantar. Assim, respeitando uma grande tradição, rompi num cântico enquanto a água quente batia nas minhas costas. Deus me falou, eu tinha imobilizado pelo pavor até um estado de alerta que me permitiu ouvir sua voz.
Às vezes é assim que acontece. Começamos a perceber uma verdade que antes só sabíamos explicar: que Deus não despreza um espírito abatido e contrito. Sem notar o movimento, certamente sem esforço consciente, levantamo-nos devagar, convidados, e então, irresistivelmente capacitados a fazê-lo – e tornamo-nos alertas a uma dimensão de vida que nos parece estranhamente conhecida. Um senso de reunião com alguém a quem nunca conhecemos, mas que sempre nos conheceu, nos faz tremer com antecipação apaixonada e indizível.
Por alguns minutos somos consumidos por uma paixão por conhecer a Cristo, prová-lo, como degustaríamos uma refeição que nos nutre, deliciarmo-nos nEle, como a noiva amada se delicia com o noivo na noite de núpcias.
Nossa vida de adoração é transformada. Agora conversamos de verdade com alguém a quem conhecemos como pai no melhor sentido da palavra. Lemos a bíblia com novo prazer. Declarações que ouvimos quando criança sobre a bíblia, como carta de amor, finalmente, fazem sentido. Nossos corações ardem dentro de nós porque vemos Cristo, em toda a história, em toda epístola. Conhecemos o Espírito Santo de maneira nova, pessoal, e indubitavelmente presente, e sentimos a mão amável e poderosa de Deus em nossas vidas e nossos corações.
Então, como sempre acontece, o brilho desvanece. Olhamos ao nosso redor e percebemos que ainda estamos fora do jardim. O carro quebra, chamamos o guincho, que chega duas horas mais tarde e cobra demais pelo serviço. Um avião cai e sofremos a morte de um cônjuge, pai, filho, irmão, amigo. Nossos corpos se cansam mais facilmente e novas dores aparecem quase que diariamente. O tanque de gasolina fica vazio. A companhia elétrica quer o pagamento. A depressão volta. Lutas sexuais que pareciam Ter desaparecido voltam à tona.
Os patrões ignoram o bom desempenho e nosso trabalho árduo passa despercebido. Alguém nos humilha e ficamos inundados de raiva de nós mesmos. Será que aquele momento de conhecimento de Deus foi real? Foi fantasia? Será que Ele realmente está aí? Eu quero conhecê-lo ou apenas busco uma saída? Um modo de me sentir melhor? Existe alegria em Cristo sem as bênçãos de filhos piedosos, bons amigos, saúde e dinheiro? Posso sobreviver apenas com Ele?
Nossa atenção, então, volta-se para aquele desejo inconsolável, para o convite de pessoas piedosas, nosso egoísmo desgraçado, a realidade do Espírito de Deus, a inexorabilidade do sofrimento, e nossa esperança de um dia melhor. Mais uma vez ficamos imobilizados. A pressão de dar conta de tudo É aliviada e caímos. Aquietados pela percepção pujante de nossas almas, vida, e do eterno – reduzidos a desejar a Deus, nada mais. Volta-nos o frêmito de antecipação e percebemos que nossa esperança não morreu. Então, Ele fala. Mais uma vez nossos corações se erguem com nossos corpos e cantamos, dançamos, gritamos em alegria.
E a vida continua. Mais um dia, mais uma desilusão, mais um prazer. Mas, agora, ao trilhar o caminho do cotidiano, existe algo diferente. Focalizamos mais diretamente a Cristo. e devagarzinho estamos sendo transformados. Alguns dizem até perceber um brilho, um perfume sedutor.
Então um dia passamos deste mundo para o próximo. E nosso Senhor nos recebe com um grande abraço. Caímos perante Ele com reverência, maravilhados, mas seu abraço nos mantém próximos. Ele ri e diz: “Olhe para trás!” lá está nosso irmão que morreu anos antes, mais feliz do que jamais o vimos antes, e estão ali nossos pais, e o nenê do aborto espontâneo, e Dr. Lucas, e Elias e Enoque. Agora todos nós estamos rindo. Não conseguimos parar. E a voz mais doce de toda a criação diz “bem vindo”. Você finalmente chegou em casa!
Ainda temos longo caminho antes de chegar lá. Nossa jornada espiritual acaba de começar.
“Existe alegria em Cristo sem as bênçãos de filhos piedosos, bons amigos, saúde e dinheiro? Posso sobreviver apenas com Ele?”.
Texto de autoria indeterminada