Parábola Credor Incompassivo

Temos ouvido graciosos e preciosos testemunhos entre nós. Costumo dizer que o único grande milagre que o Senhor está realizando o tempo todo é o milagre da salvação, o milagre da transformação de vidas. É muito animador ouvir tantos testemunhos como os que ouvimos esta noite.

Certa vez, ouvi um depoimento muito perturbador. Um judeu chamado Wiesenthal, era prisioneiro em um campo de concentração nazista na Polônia. Ele foi obrigado a fazer parte da equipe de limpeza de um hospital que tratava os soldados alemães feridos em batalha. Um dia, uma enfermeira o puxou pelo braço e o levou à presença de um soldado nazista moribundo, à beira da morte.

Este soldado havia praticado atrocidades terríveis contra os judeus. Aquele homem estava desesperado para pedir perdão a um judeu. Quando a enfermeira trouxe Wiesenthal, aquele soldado tentou falar de como ele era antes de se tornar uma máquina de assassinar judeus. Ele agarrou a mão de Wiesenthal, disse que tinha que falar com um judeu, que não poderia morrer antes de confessar os pecados que cometeu contra judeus indefesos, e que ele tinha que ser perdoado por um judeu antes de morrer.

E então, ele contou a Wiesenthal sua triste e perturbadora história, de que ele pertencia a um batalhão que havia abatido muitos, muitos judeus, homens, mulheres e crianças. Numa ocasião, muitos tentavam escapar de uma casa que os soldados haviam incendiado, mas eles foram simplesmente abatidos de forma cruel.

Wiesenthal ouviu a história do moribundo. Primeiro, a história de sua juventude, sua juventude inocente. E depois, a história de sua participação no mal e o massacre dos judeus. Depois de ouvir a história, Wiesenthal largou a mão dele, não disse nenhuma palavra e se retirou. Nenhum perdão foi dado.

Wiesenthal escreveu sua própria história em um livro que termina com esta pergunta: “O que você teria feito?” Trinta e duas pessoas ilustres, na sua maioria judeus, contribuíram com respostas para a sua difícil pergunta. A maioria disse que Wiesenthal estava certo, ele não deveria ter perdoado o soldado nazista, dizendo que não teria sido justo que um homem tão perverso recebesse uma rápida palavra de perdão em seu leito de morte.

Muitos foram além e disseram que Wiesenthal não tinha direito de perdoar um homem que fez tanta perversidade aos judeus. Alegaram que se ele tivesse perdoado o soldado, estaria dizendo que o holocausto não foi tão maligno. Um entrevistado disse: “Deixe o soldado nazista ir para o inferno”.

Bem, está muito longe do que o Senhor nos diz, não é? E, contudo, muitos de nós nos sentimos da mesma maneira quando somos tratados de forma injusta ou quando somos feridos e maltratados de maneira muito menos brutal que os judeus sofreram com os nazistas. E às vezes o nosso ódio é a nossa resposta e a arma que usamos é o desprezo. Parece que nos equilibramos nisto e questionamos: Por que devo perdoar incondicionalmente?

Há alguns anos eu escrevi um livro chamado “The Freedom and Power of Forgiveness” (“A Liberdade e o Poder do Perdão”). As pessoas sempre me perguntam, qual é o meu livro favorito dos livros que escrevi? Este me parece o mais importante. Nunca você é mais parecido com Deus do que quando você perdoa. Jesus foi direto ao dizer: “Amai a vossos inimigos, bendizei os que vos maldizem, fazei bem aos que vos odeiam, e orai pelos que vos maltratam e vos perseguem; para que sejais filhos do vosso Pai que está nos céus”.

O perdão é crítico em nossas vidas. Todas as relações violadas que foram destruídas, o foram por causa da falta de perdão e não por causa da violação. Você pode se recuperar de qualquer violação, se você perdoar. Nunca haverá reconciliação se não houve o perdão. Entre aqueles que são cristãos, na comunhão do povo de Deus, a falta de perdão é absolutamente inaceitável. A falta de perdão é um pecado grave.

Abra sua Bíblia em Mateus 18 e vamos aprender com o Senhor Jesus sobre o perdão. Nesse capítulo temos uma mensagem de Jesus, interrompida apenas nos versículos 21 e 22, onde Pedro faz uma pergunta. E Mateus nos diz que Jesus lhe deu uma resposta. É uma longa apresentação de nosso Senhor sobre a semelhança do crente com a atitude de uma criança inocente. Jesus diz: “se não vos converterdes e não vos fizerdes como meninos, de modo algum entrareis no reino dos céus” (Mateus 18:3). Se formos convertidos, tornamo-nos como crianças. E é assim que entramos no Reino dos céus. E é assim que nos comportamos no reino.

Devemos ser protegidos como crianças e não fazer nada para levar qualquer outro crente a algo prejudicial ou pecaminoso. Devemos ser cuidados e disciplinados como crianças. São características da vida entre os filhos de Deus. Nós protegemos e nos preocupamos uns dos outros, bem como confrontamos o pecado uns dos outros. Assim, colocamo-nos em um processo que nos remete para a santidade e a obediência. E agora temos uma questão importante levantada por Pedro: “Senhor, até quantas vezes pecará meu irmão contra mim, e eu lhe perdoarei?”. Tudo isto aconteceu num contexto em que Jesus diz que devemos nos tornar como crianças para entrar no reino. Uma pequena criança foi a ilustração que Jesus usou para representar os crentes.

Aqui Ele vai nos dizer que é fundamental, como crianças, que nos perdoemos uns aos outros. Normalmente, não temos muitos problemas para perdoar as crianças, porque sabemos que elas são fracas. Não temos dificuldade em perdoar nossos próprios filhos quando eles estão errados, nos desobedecem e pecam, porque os amamos e entendemos que são fracos. E assim deve ser na família de Deus.

Tem que haver grande espaço para o perdão. E, como eu disse, nada o deixa mais parecido com Deus do que quando você tem um coração perdoador. Provérbios 19:11 diz: “A prudência do homem faz reter a sua ira, e é glória sua o passar por cima das transgressões”. A capacidade de perdoar mostra a nobreza do caráter. Efésios 4:32 diz “…perdoando-vos uns aos outros, como também Deus vos perdoou em Cristo”. Colossenses 3:13 diz:

Suportai-vos uns aos outros, perdoai-vos mutuamente, caso alguém tenha motivo de queixa contra outrem. Assim como o Senhor vos perdoou, assim também perdoai vós.

Devemos perdoar porque é divino. Devemos perdoar porque entendemos que somos fracos, falhamos, pecamos e estamos sempre precisando receber o perdão. Devemos perdoar porque é a coisa mais nobre que podemos fazer. Devemos perdoar porque Deus em Cristo nos perdoou.

Temos muitas ilustrações de perdão na Bíblia, tais como José perdoando seus irmãos pela terrível ação de vendê-lo como escravo (Gênesis 50:17-21) e Davi perdoando o seu inimigo Saul, que buscava mata-lo (I Samuel 24). A maior ilustração do perdão é Deus em Cristo. O perdão é básico para a experiência cristã.

O perdão é tão básico com os tratos de Deus conosco que também deve ser básico no nosso lidar uns com os outros. Sim, admitimos que somos fracos, pecaminosos, tolos, propensos à desobediência, ignorantes. Precisamos muito do perdão. Em vez de estar ansiosos para condenar, precisamos estar ansiosos para perdoar.

Em II Corintios 2, eu penso que havia alguém na igreja de Corinto que trouxe muita dor a Paulo e à igreja. Paulo não foi tomado por um sentimento vingativo. Ele mesmo se referia a si mesmo como o pior dos pecadores e, consequentemente, necessitava de muito perdão e misericórdia (I Timóteo 1:15-16). E assim ele tratou:

Ora, se alguém causou tristeza, não o fez apenas a mim, mas, para que eu não seja demasiadamente áspero, digo que em parte a todos vós; basta-lhe a punição pela maioria. De modo que deveis, pelo contrário, perdoar-lhe e confortá-lo, para que não seja o mesmo consumido por excessiva tristeza. Pelo que vos rogo que confirmeis para com ele o vosso amor (II Coríntios 2:5-8).

Mais na frente ele diz: “para que Satanás não alcance vantagem sobre nós, pois não lhe ignoramos os desígnios”. Isso basta. Você enfrenta o pecado. Você lida com o pecado. Você ganha seu irmão, como aprendemos anteriormente no capítulo 18 de Mateus, e agora é hora de inundá-lo com perdão e encorajamento.

Você quer ser uma engrenagem dos esquemas de Satanás? Então, seja implacável! Essa é uma porta bem aberta para Satanás usar você. Se você não perdoa, você estará dando vantagem ao inimigo de nossas almas.

O perdão, então, no Novo Testamento é uma questão muito, muito importante. Volte para Mateus 6, por um momento. Aqui Jesus nos ensinou a orar dizendo: “perdoa-nos as nossas dívidas, assim como nós temos perdoado aos nossos devedores”. Ou seria o mesmo que dizer: “Perdoa-nos os nossos pecados, assim como nós também perdoamos aqueles que pecaram contra nós”.

Há um sentido em que não desfrutaremos da plenitude do perdão de Deus se não perdoarmos os outros. Porque se não perdoamos os outros, estamos em pecado. Nos versos 14 e 15 Jesus diz:

Porque, se perdoardes aos homens as suas ofensas, também vosso Pai celeste vos perdoará; se, porém, não perdoardes aos homens, tampouco vosso Pai vos perdoará as vossas ofensas.

Você estará em uma situação, mesmo como um crente, onde diante do Senhor você tem pecado que não foi tratado e você estará sob disciplina e castigo, ao invés de aproveitar a alegria da confissão, arrependimento e perdão.

Quão importante é o perdão? Nunca você é tão semelhante a Deus do que quando você perdoa. Nunca você é mais nobre do que quando perdoa. Ou seja, é a glória de um homem passar por cima de uma transgressão, de uma ofensa. Quando você perdoa os outros, você se livra do pecado da falta de perdão e você abre os portões de derramamento da benção de Deus e do Seu perdão. O perdão é um ponto essencial na vida da igreja de Jesus Cristo.

As rupturas na família e na igreja acontecem, em última análise, por falta de perdão. Não há nenhum relacionamento isento do pecado, onde as ofensas não aconteçam. Não há. Isto vale para todos os níveis de relacionamento humano. Não podemos sobreviver sem perdão. Eu preciso do perdão, você também precisa, todos precisam do perdão. Temos que viver no meio de um ambiente que flua o perdão. Esta deve ser a nossa maior alegria. Deve ser nosso deleite, porque Deus se deleita em nos perdoar.

Em Mateus 18: 15-17, Jesus fala que quando alguém peca na igreja, você deve ir até ele. Se ele se arrepender, você ganhou seu irmão. Se ele não se arrepender, você deve pegar duas ou três testemunhas e confrontá-lo. Se ele ainda não se arrepender, deve leva-lo diante da igreja. Se ele não ouvir a igreja e se arrepender, expulse-o.

Agora, Pedro está ouvindo tudo isso. Geralmente ele era o porta-voz dos discípulos. Podemos pensar que todos estavam tendo os mesmos pensamentos. Na maioria das vezes, sempre esperamos não precisar chegar ao último passo que Jesus ensinou. Pensamos sempre que haverá arrependimento e contrição. Mas, se isto não acontecer? O que devemos fazer? Esta era a questão que inquietava Pedro.

Então, em Mateus 18:21 ele pergunta: “Senhor, até quantas vezes meu irmão pecará contra mim, que eu lhe perdoe? Até sete vezes?”. Pedro tinha uma língua rápida e uma mente questionadora. Era um curioso. Gosto muito de pessoas curiosas, talvez porque eu seja um homem muito curioso. Nunca estou satisfeito com uma compreensão superficial de qualquer assunto. Pedro era exatamente assim, e esse é um dos vários motivos pelos quais eu gosto muito dele.

E então, ele diz: “Agora, exatamente, quantas vezes eu deveria perdoar? Sete vezes?”. O rei francês Luis XII disse: “Nada cheira tão doce quanto o corpo morto de seu inimigo”. O perdão é estranho à natureza do homem caído. O que é consistente com a natureza do homem caído é a raiva, ódio, vingança, retaliação e rancor. É uma marca onipresente no mundo decaído.

Mas o povo de Deus deve ser como Jesus, que pendurado na cruz disse: “Pai, perdoa-lhes porque eles não sabem o que fazem” (Lucas 23:34). Ou como Estevão, que quando estava à beira da morte por apedrejamento, disse: “Senhor, não lhes imputes este pecado” (Atos 7:60). E, depois de dizer isso, morreu. O perdão é uma atitude cristã, porque Deus, por meio de Cristo, nos perdoou. Não temos nada contra a pessoa que nos prejudicou. Em qualquer condição, devemos perdoar e libertar nosso coração de qualquer rancor ou vingança.

Agora, certamente, esta é a atitude implícita no processo de disciplina em Mateus 18: 15 a 18. Você vai ao pecador, confronta o pecador, o pecador se arrepende, você o ganhou, é isso. Reconciliação. Ganhar seu irmão é reconciliação. Essa é a ideia inteira. Quando ele confessa o pecado, você perdoa e ganhou seu irmão. A restauração completa vem quando o arrependimento verdadeiro vem. Você vai para a pessoa, confronta a pessoa, ela se arrepende, agora você não tem apenas perdão, mas reconciliação.

E então, Pedro pergunta: “Qual é a extensão disso? Qual é a extensão desse perdão? Sete vezes?”. A tradição judaica limitava o perdão a três vezes. Baseavam este conceito em várias passagens em Amós e uma declaração em Jó 33:29 que não dizia isso. Mas o ensino era organizado ao gosto dos líderes religiosos. Para eles, se três transgressões preenchem a medida que Deus perdoaria, não poderíamos ir além de Deus. O rabino Joseph Ben Hannena disse: “Aquele que pede perdão ao seu vizinho não deve fazê-lo mais de três vezes”. O rabino Joseph Ben Yahoida disse: “Se um homem cometeu uma ofensa uma vez, eles o perdoam. E se ele comete uma ofensa pela segunda vez, eles o perdoam. Se ele cometeu uma ofensa uma terceira vez, eles o perdoam. Na quarta vez, eles não perdoam”. Então, os rabinos colocaram limites de perdão. Pedro foi criado nesta cultura e dessa forma teria entendido.

Então, sem dúvida, quando Pedro diz sete vezes, ele pensava estar alcançando as alturas de generosidade. Ele provavelmente pensou que seria louvado pelo Senhor por ser tão gentil. Talvez Influenciado pelo que via na vida de Jesus, ele avançou de três para sete perdões e achou ter chegado a um lugar muito nobre. Mas, Jesus lhe respondeu: “Não te digo que até sete vezes, mas até setenta vezes sete” (Mateus 7:22).

Uau! Isso deve ter tirado o fôlego de Pedro. Ele poderia fazer a matemática. Quatrocentos e noventa vezes? Agora, isso não quer dizer que você conta e quando atingiu 491, acabou. O número é tão grande, que manter a contagem seria impossível. O Senhor apenas quis mostrar a infinitude do perdão. Lucas 17:3-4 diz: “Acautelai-vos. Se teu irmão pecar contra ti, repreende-o; se ele se arrepender, perdoa-lhe. Se, por sete vezes no dia, pecar contra ti e, sete vezes, vier ter contigo, dizendo: Estou arrependido, perdoa-lhe”.

Ou seja, você perdoa, perdoa, perdoa e continua perdoando. Isso é interminável. Sem limites, sem fronteiras, implacável, infinito, constante perdão. E, em seguida, para selar isso nas mentes dos ouvintes, Jesus conta uma história maravilhosa. Ele começa dizendo:

Por isso, o reino dos céus é semelhante a um rei que resolveu ajustar contas com os seus servos. E, passando a fazê-lo, trouxeram-lhe um que lhe devia dez mil talentos (Mateus 18:23-24).

É uma parábola muito familiar. Você tem um rei que tem um reino. É uma imagem de Deus e Seu Reino celestial. Este rei tinha alguns servos. Esses servos receberam dinheiro para operar em seus domínios delegados. Talvez fossem governadores regionais ou líderes regionais. Eles eram responsáveis a prestarem contas ao rei sobre os recursos que receberam. Isto envolve cobrança de impostos, uso do dinheiro segundo os propósitos do rei etc. O primeiro lhe devia dez mil talentos. Isto era uma quantidade inimaginável de dinheiro. O talento era a maior denominação de moeda e, numa linguagem popular, “dez mil” significava um número infinito. Então:

Não tendo ele, porém, com que pagar, ordenou o senhor que fosse vendido ele, a mulher, os filhos e tudo quanto possuía e que a dívida fosse paga (Mateus 18:25).

Seu senhor ordenou que ele fosse vendido, junto com sua esposa e filhos, como escravos, bem como tudo o que ele tinha. Porém, mesmo fazendo tudo isto, a dívida continuaria monstruosa e impagável. O rei tinha todo o direito de fazer isso. O homem estava em dívida e não tinha capacidade para pagar. Veja então a sequência:

Então, o servo, prostrando-se reverente, rogou: Sê paciente comigo, e tudo te pagarei. E o senhor daquele servo, compadecendo-se, mandou-o embora e perdoou-lhe a dívida (Mateus 18:26-27).

É uma imagem de Deus, não é? O pecador vem diante de Deus com uma dívida impagável. Ele havia rejeitado o Evangelho, desprezou a revelação e privilégio, não deu honra a Deus e desperdiçou sua vida. Ele acumulou uma conta de pecado impossível de ser paga. E Deus diz: “Bem, é uma dívida impensável, Eu poderia enviá-lo para o inferno e obter alguma compensação.” O inferno é para sempre, porque, mesmo lá, a dívida segue impagável.

Veja que o servo diz: “Tenha paciência comigo, eu vou pagar tudo.” Essa parece ser uma boa intenção. É a suposição de que você mesmo pode construir o seu caminho para Deus, que você mesmo pode comprar sua reconciliação através de boas obras. Assim você pensa poder quitar aquela dívida impagável, impressionar Deus e fazer desaparecer o débito incalculável. Ou seja, você imagina que suas boas obras compensarão todo o mal.

Ele estava errado sobre isso, é claro. O senhor do escravo sentiu compaixão, liberou-o, perdoou-lhe a dívida. E é assim que o perdão funciona. O Senhor revogou a dívida, ela desapareceu. Na parábola do filho pródigo, ele pensou em voltar como um dos empregados de seu pai, mas encontrou um pai que o recebeu como filho, sem dívidas a pagar.

Bem, Pedro e todos os seus amigos estão ouvindo a história. É uma história incrivelmente simples e que eles poderiam entender. E eles podem ter pensado: Que rei maravilhoso! Perdoou uma dívida tão grande sem exigir nada!

Essa era a história deles mesmos, ok? Eles vieram a Cristo, haviam sido perdoados sem compensações, entenderam a salvação como um presente gratuito de Deus. Então, eles gostam muito da história até aqui. Era óbvio para eles que essa era uma imagem do Reino dos Céus. Era uma alegoria de como Deus perdoa e tem compaixão. E eles estavam usufruindo disto. Eles devem ter pensado: “Esta é a nossa história. Que maravilhoso!”. Mas a história continua:

Saindo, porém, aquele servo, encontrou um dos seus conservos que lhe devia cem denários; e, agarrando-o, o sufocava, dizendo: Paga-me o que me deves (Mateus 18:28).

Um denário equivalia ao salário de um dia. Portanto 100 denários equivalia a 3 meses de trabalho. Não era uma quantia desprezível, mas uma ninharia em comparação com a dívida que havia sido perdoada. Mas o mesmo homem que havia recebido o perdão de uma dívida impagável, agora agarra e sufoca outro que lhe devia algo infinitamente inferior.

Francamente, isso é ultrajante. Quem está sendo retratado aqui? O cristão ofendido que não perdoará, embora tenha sido perdoado. Ficamos alegres em saber que o Senhor sempre está aberto a nos perdoar sem limites, porém, quando alguém nos ofende, nós o agarramos e dizemos: “Pague o que você me deve”, e mantemos um coração rancoroso. E a história segue:

Então, o seu conservo, caindo-lhe aos pés, lhe implorava: Sê paciente comigo, e te pagarei. Ele, entretanto, não quis; antes, indo-se, o lançou na prisão, até que saldasse a dívida (Mateus 18: 29-30).

Que cenário triste e repugnante. E assim:

Vendo os seus companheiros o que se havia passado, entristeceram-se muito e foram relatar ao seu senhor tudo que acontecera (Mateus 18:31).

Os servos que conheciam a história voltaram para o senhor, o rei: “Aquele a quem o senhor perdoou aquela dívida impagável, estrangulou e jogou na prisão um homem que lhe devia uma ninharia em relação à sua dívida!”.

Então, o seu senhor, chamando-o, lhe disse: Servo malvado, perdoei-te aquela dívida toda porque me suplicaste; não devias tu, igualmente, compadecer-te do teu conservo, como também eu me compadeci de ti? (Mateus 18:32-33).

Este é um comportamento ultrajante. Dentro da família de Deus, entre os filhos de Deus, dentro do corpo de Cristo, a falta de perdão para com qualquer outro crente que pecou contra nós, de alguma forma, é algo indignante, porque somos nós que aceitamos o completo perdão de Deus. Nós nos alegramos com a nossa aceitação. Se Deus, que é santíssimo, e é tão ofendido por todo pecado que comentemos, nos perdoa, nós que somos pecadores deveríamos estar ansiosos para perdoar. E há uma penalidade por não se perdoar:

E, indignando-se, o seu senhor o entregou aos verdugos, até que lhe pagasse toda a dívida. Assim também meu Pai celeste vos fará, se do íntimo não perdoardes cada um a seu irmão (Mateus 18:34-35).

Você vai ter problemas com Deus, se você não perdoa. Ele vai entregar você a algum tipo de disciplina espiritual e extrair de você tudo o que Ele pode obter por meio dessa disciplina, se você não perdoa.

Ter um coração perdoador é a máxima expressão de um coração que se assemelhar ao coração de Deus. Nada é mais nobre que o perdão. O perdão liberta o coração da amargura, vingança, retaliação e rancor. Você perdoa porque Deus perdoou você em Cristo. Se você não perdoar, você não será perdoado e será entregue aos atormentadores para uma forte disciplina.

Os verdugos não se referem a carrascos ou à condenação eterna, mas a uma disciplina severa. E ali toda a dívida teria que ser paga. Mas, lembre-se que a dívida era impagável, aquele homem não teria como pagá-la. Aquela dívida seria paga por meio de uma severa disciplina, até que ele se dispusesse a perdoar os outros.

Eu quero estar numa posição de agradar ao Senhor. Não quero que Deus me entregue aos atormentadores para que eu aprenda o que deveria aprender de outra forma. Quero estar do lado da bênção, da alegria, do conforto e do encorajamento. E então, eu preciso sempre estar ansioso para perdoar.

Wiesenthal, o prisioneiro judeu que negou o perdão ao soldado nazista, não conhecia Cristo. E ele também não experimentou o perdão de Deus em Cristo. Não há lugar para a falta de perdão. Na verdade, no próximo domingo estaremos diante da mesa do Senhor (ceia). Não pense em vir adorar ao Senhor, se você tiver algo em seu coração contra outra pessoa. Isso simplesmente aumenta sua culpa, e o coloca sob a disciplina do Senhor.

Quero encerrar falando de três estágios no perdão. O primeiro: sofrimento. Isso cria a necessidade de perdão. Nem todas as feridas precisam ser perdoadas. Ao longo de meu ministério já ouvi pessoas desconhecidas me procurando e dizendo: “Preciso pedir seu perdão”. Eu nem sabia quem era e nem sabia nada sobre elas. Mas elas disseram: “Eu sei que você não sabe quem eu sou, mas preciso pedir seu perdão”.

Eu respondi: “Bem, eu só quero deixar claro que eu não tenho nenhum motivo para perdoá-lo, porque não tenho conhecimento de nada que você tenha feito contra mim”. E ouvi respostas como: “Oh, mas deixe-me dizer o que eu fiz contra você…”. Eu prontamente respondi: “Por quê? Por que eu teria que saber?”. Não é cada pequeno aborrecimento, cada coisa leve que requer perdão. Precisamos passar por muitas coisas como se não tivessem acontecido.

Temos que aprender a superar certas pequenas coisas e deixa-las para lá. As coisas que precisamos perdoar são as moralmente perversas, malignas. São atos de feridas, deslealdades, traições, injustiças, transgressões. Essa é a primeira etapa. Precisa haver algum sofrimento moral. Precisamos aprender a passar por cima de coisas pequenas.

Em segundo lugar, eu chamo de: o estágio da cirurgia. Aqui está a resposta interna onde o perdoador realiza uma cirurgia espiritual na ferida. E você é seu próprio cirurgião sobre isso, auxiliado pelo Espírito Santo e pela Palavra de Deus. Você começa a cortar a atitude de falta de perdão e costurar a ferida.

O terceiro estágio é: começando de novo. O perdão é completo quando as pessoas se reconciliam. Depois do sofrimento e depois daquela cirurgia cardíaca, vem um novo dia, tudo está limpo. Isso não significa que você esquece o erro, mas que toda vez que se lembra dele, você se alegra com o perdão liberado. Você reconhece o pecado e a culpa de quem cometeu, mas perdoa o pecado. E não significa que nos libertamos permanentemente do ciclo da dor. Ainda pode haver emoções recorrentes da dor passada. Mas quando elas voltarem, você se alegra por ter perdoado.

Esta é a única maneira de proceder no corpo de Cristo e manter nossa unidade. Não há como impedir ocorrências de ofensas, mas que sejamos conhecidos como perdoadores. Sejamos perdoadores constantes, dotados de um perdão generoso e bondoso. Um perdão visível, demonstrado por nossos atos. Se você está tendo problemas com isso, comece a orar pela pessoa em relação a qual está tendo problemas para perdoar regularmente.

Um coração perdoador é o que mais se parece com o coração de Deus. O perdão é fundamental para a vida do povo de Deus em todos os níveis, seja no casamento, família, todos os relacionamentos e na vida da igreja. O que o Senhor tem construído aqui na Grace Church não é porque somos perfeitos e tenhamos líderes perfeitos, mas porque temos conservado um coração perdoador e uma atitude reconciliadora.

Nós temos cuidado uns dos outros, protegendo-nos mutuamente, perdoando, disciplinando e confrontando. Buscando um coração humilde como de uma criança. Aqui não é um bom lugar para o pecado, porque provavelmente você será confrontado. Mas, paradoxalmente, por outro lado, este é o melhor lugar para o pecador, porque quando você se arrepender, esta congregação provavelmente abraçará você em perdão e amor. É o que fomos chamados a fazer como filhos de Deus.

Oremos:

Pai, Obrigado por Tua Palavra sobre este assunto e certamente acabamos de tocar a superfície dele, mas é um assunto rico e magnífico para nós. Preencha nossos corações com carinho, amor e perdão para com nossos inimigos, aqueles que nos feriram e nos maltrataram. Nós ouvimos um testemunho do irmão Choyce, maravilhoso naquela noite, no batismo, sobre como o Senhor entrou em sua vida e, de repente, todas as pessoas que ele odiava por causa de seus abusos contra ele, tornaram-se pessoas que ele cuidava, amava e desejava que Te conhecessem. Este é o Teu poderoso trabalho em nossos corações. O Senhor nos perdoou uma dívida impagável, pelo que desejamos ser graciosos e perdoar aqueles que nos rodeiam, reconciliarmo-nos com eles por Tua causa, a unidade da Tua igreja, a solidariedade do testemunho do Teu poder transformador através do evangelho. E agradecemos a Ti que o Espírito de Deus faz com que isso aconteça. É o Espírito que é a cola, o vínculo que nos mantém em paz. Desejamos que honremos ao Senhor, em nome de Cristo. Amém.


Este texto é uma síntese do sermão “The Childlikeness of Believers: Granting Forgiveness”, de John MacArthur em 13/01/2008.

Você pode ouvi-lo integralmente (em inglês) no link abaixo:

https://www.gty.org/library/sermons-library/90-349/the-childlikeness-of-believers-granting-forgiveness

Tradução e síntese feitos pelo site Rei Eterno


 

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