3 marcas da fé não salvadora
Finalmente chegamos em nosso estudo do Evangelho de Lucas à última seção do capítulo 9. Vamos ver os versos de 57 a 62.
Lucas 9
57 Indo eles caminho fora, alguém lhe disse: Seguir-te-ei para onde quer que fores.
58 Mas Jesus lhe respondeu: As raposas têm seus covis, e as aves do céu, ninhos; mas o Filho do Homem não tem onde reclinar a cabeça.
59 A outro disse Jesus: Segue-me! Ele, porém, respondeu: Permite-me ir primeiro sepultar meu pai.
60 Mas Jesus insistiu: Deixa aos mortos o sepultar os seus próprios mortos. Tu, porém, vai e prega o reino de Deus.
61 Outro lhe disse: Seguir-te-ei, Senhor; mas deixa-me primeiro despedir-me dos de casa.
62 Mas Jesus lhe replicou: Ninguém que, tendo posto a mão no arado, olha para trás é apto para o reino de Deus.
Três discípulos e o assunto é: “Seguir Jesus”. O primeiro homem diz: “Eu vou segui-Lo”. Ao segundo homem, Jesus diz: “Siga-Me”. O terceiro homem diz: “Eu seguirei a Ti”.
Seguir é a palavra operativa aqui. É sobre seguir Jesus. Esse é o assunto. É sobre o alto custo de seguir Jesus. É sobre o que impede as pessoas de seguirem Jesus.
‘Seguir’ é uma palavra muito familiar nos Evangelhos, pois Jesus muitas vezes chamou as pessoas a segui-Lo. Ele chamou Mateus para segui-Lo, bem como o jovem rico, Filipe, Pedro, chamou os doze e muitos outros para segui-Lo.
Sempre quando Ele fez isso, Ele usou uma mesma palavra, no presente imperativo e que implicava uma ordem em andamento. “Seguir” implica um futuro, continuidade, algo além do momento. Ou seja: “De agora em diante em sua vida, siga-Me”.
Isso realmente não é típico do estilo moderno de chamar as pessoas para o discipulado ou evangelismo. O evangelismo moderno nos leva a crer que tornar-se um cristão é uma questão de um momento, não de uma vida.
É uma questão de aceitação a Cristo. É uma questão de uma experiência emocional para a qual você foi conduzido através de uma pregação ardente ou por histórias ou músicas que emocionam o coração.
Qualquer coisa que possa ser usada para induzir uma pessoa a um momento de colapso emocional, onde elas vão fazer uma oração, tomar uma decisão e aceitar Cristo, parece ser a direção do evangelismo evangélico moderno.
Tudo o que a pessoa tem que fazer é agarrar esse momento e fazer uma oração. E, se eles não sabem fazer esta oração, é lhes dado uma fórmula para recitar, para orar. E isso é tudo o que é preciso fazer para se tornar um cristão, na visão deste moderno evangelismo.
É óbvio que Jesus nunca fez isso. Ele nunca usou momentos de decisão ou aceitação de Si mesmo. Ele nunca trouxe alguém para um lugar onde essa pessoa deveria fazer uma oração de aceitação. Ele nunca fez isso e nunca os apóstolos fizeram isso.
No entanto, o chamado para vir a Cristo e a obter a salvação é tipicamente visto, em nosso mundo, como uma resposta a um momento emocional.
Não é assim nas palavras de Jesus. Quando Ele convidava alguém para entrar em Seu reino, receber Seu perdão e salvação, Ele falava sobre algo que duraria pelo resto da vida. Ele não queria um momento. Ele não queria a emoção de um momento.
Ele queria algo cuidadosamente pensado, entendido, um compromisso de arrependimento do pecado, confissão de Seu senhorio, obediência de coração à Palavra e ao Espírito para a uma vida toda.
Sempre houve essa ênfase no ministério de Jesus. Ele desdenhou do discípulo de curto prazo. Ele tornou as coisas tão difíceis para muitos discípulos que, por exemplo, o capítulo 6 de João, diz: “Muitos de Seus discípulos não andavam mais com Ele”. O padrão foi muito alto. Aquilo que era necessário era muito exigente.
Agora, no texto diante de nós temos três ilustrações sobre seguir a Cristo. A palavra “seguir” aparece em cada uma. Dois discípulos vêm e declaram que O seguirão e a outro, Jesus pede que ele O siga.
Novamente, como sempre, no presente imperativo, Ele está requerendo toda uma vida, é um chamado à mais completa devoção, para um seguimento permanente. Não é um evento, é para o resto de sua vida.
E isso é coerente com o que Jesus disse no versículo 23 deste capítulo. Você se lembra? “Se alguém quiser vir após Mim, negue-se a si mesmo”. Este foi o convite de Jesus. Foi um chamado à total abnegação.
Lutero, na quarta de suas Noventa e Cinco Teses afixadas na porta da igreja em Wittenberg, disse que era essencial uma atitude de auto-ódio para que alguém entrasse no reino dos céus.
E uma vez que você passou por essa autonegação ou auto-ódio, porque você não quer mais se associar com o pecador que você é, você está desesperado.
Nesse ponto, quando Jesus diz a você: “Estou pedindo um compromisso por toda a vida” e você está na posição de dar a resposta afirmativa uma vez que você acabou de se abandonar completamente. Essa é a primeira metade. E agora você está pronto para abraçar o senhorio de Cristo com inabalável lealdade e devoção, sem obstáculos.
Precisamos estar chamando os pecadores para seguir Jesus como um modo de vida. Muitos estão apenas “aderindo” ao cristianismo. Algo sazonal, emocional e sem sentido.
Essas pessoas tornam-se ligadas a muitas coisas no meio da igreja, menos ao Senhor Jesus. Tornam-se apenas falsos cristãos.
O verdadeiro convertido segue a Jesus o tempo todo em uma alegre negação de si mesmo. Ele percebe sua falência e agarra-se na viva esperança que é Cristo. Ele rejeita sua estrutura falida para buscar a Rocha Eterna de sua salvação. Somente assim o homem alcançará a salvação.
Na verdade, sempre me surpreende a quantidade de pessoas com as quais Jesus teve uma conversa e Ele colocou uma barreira entre elas e a salvação. Não seria fácil ser salvo, se você estivesse conversando com Jesus.
Ele nunca levou ninguém a uma resposta superficial, mesmo as pessoas que criam Nele. Ele sempre levantou a barreira do pecado, abnegação, assumir uma cruz, odiar a família e estar disposto a desistir de tudo o que a pessoa é e tem.
O quanto isso é importante para você, é realmente a questão. Não é que Ele necessariamente peça tudo isso, mas se Jesus Cristo é suficientemente importante para você, então você ficaria feliz em receber Jesus Cristo sob quaisquer condições que Ele pudesse pedir.
Jesus sempre estabeleceu um alto preço, por causa do valor infinito das riquezas celestiais. E, nesse texto de Lucas, vemos isto com três pretensos aspirantes ao cristianismo.
Para cada um desses casos há uma barreira que Jesus coloca. E o fim da história é, obviamente, que todos se foram. Nenhum deles respondeu positivamente ao que Jesus disse.
Então, aqui você pode dizer que Jesus tinha três perspectivas evangelísticas e Ele estabeleceu condições que levaram seus ouvintes a irem embora sem a vida eterna.
Em Lucas 9:23, temos o padrão para seguir a Jesus: abnegação, autossacrifício e autossubmissão. Você está no fim de si mesmo, você tem uma atitude de beatitude, você está de luto por sua pecaminosidade, você é manso e humilde porque você entende a falência do seu coração.
Você tem fome e sede de justiça a tal ponto que você não tem nenhum apego às coisas materiais. É esse nível de desespero que diz que eu cheguei ao fim de mim mesmo. Eu não quero mais me associar comigo mesmo. É bater no meu peito e clamar a Deus que seja misericordioso comigo, um pecador, e me dê Cristo como meu Senhor e meu Salvador, a quem seguirei com alegria pelo infinito valor do que receberei.
Agora, à medida que chegamos ao texto de Lucas 9:57-62, vou dar apenas uma nota que não está clara aqui. Mateus 8:18-22 descreve este evento no ministério na Galileia em torno da cidade de Cafarnaum. No texto de Lucas, estamos fora da Galileia agora, Jesus já havia terminado Seu ministério lá e estava se movendo para fora da Galileia.
No versículo 51 de Lucas 9, Jesus tinha decidido ir para Jerusalém. Então, Ele está a caminho de Jerusalém. Em menos de um ano Ele seria morto na cruz.
Ele passa em vários lugares para treinar Seus discípulos. Mateus nos diz que o relato de Lucas 9:57-62 aconteceu durante o ministério galileu. Lucas o incluiu aqui nesse capítulo porque fez parte do treinamento dos doze. Este relato aconteceu em algum lugar perto de Cafarnaum, na Galileia.
E havia, naturalmente, muitos que seguiam Jesus. Quando diz no verso 57: “Indo eles caminho fora”. “Eles” representam uma multidão. Envolve Jesus, os doze, outros discípulos, como os 70 de Lucas 10:1, e muitos que queriam matá-lo.
Mateus nos diz que quando este incidente aconteceu, Jesus havia feito muitos milagres poderosos. Assim, sempre que isso acontecia, havia um aumento na multidão.
Jesus fazia coisas que nunca homem algum havia feito na terra, tanto em sinais como em sabedoria e autoridade. Havia evidências inconfundíveis de que Ele era o Messias prometido no Velho Testamento.
Todos no meio desta multidão eram chamados de discípulos, não importando se eram verdadeiros ou não. De fato, no relato de Mateus, um desses homens é até chamado discípulo. Mas, não o confunda com um apóstolo. Ser um discípulo nesse contexto não significava ser alguém com a fé salvadora.
Em João 6, muitos de Seus discípulos foram embora, deixaram-No e não andavam mais com Jesus. Significa simplesmente que eles estavam lá como aprendizes.
Mas, esses três chegaram ao ponto de estarem convencidos de que Jesus era o porta-voz de Deus. Eles estavam convencidos de que não havia ninguém como Ele. Eles obviamente estavam convencidos de Seus poderes milagrosos.
Nenhum dos Seus milagres foi questionado, nem mesmo pelas pessoas que O odiaram mais. Eles sabiam que Jesus era um homem de Deus. Eles estavam convencidos, talvez, de que Ele era mesmo o Filho de Deus, o Messias.
Eles chegam até ao ponto de afirmar que estão prontos para seguir Jesus. Vocês poderiam chamá-los de ‘promissores’ para o reino de Deus. E, no entanto, quando Jesus terminou a conversa com eles, eles se viraram e partiram. Eles não suportaram o negar a si mesmos.
O primeiro suposto seguidor de Jesus foi impedido pelo desejo de conforto pessoal.
Em Mateus 8:19, temos especificamente que ele era um escriba: “E, aproximando-se dele um escriba, disse-lhe: Mestre, aonde quer que fores, eu te seguirei”. Este foi um momento de emoção. Ele tinha visto muitos milagres, registrados em Mateus 5:8-18. Ele foi atraído por Jesus. Ou seja: “Quero ir para onde o Senhor for. Vou deixar a minha carreira de escriba”.
Os escribas eram pessoas muito estimadas na vida judaica. Eram os peritos da lei, advogados religiosos que interpretavam a lei da maneira como advogados interpretam uma lei qualquer.
Eles interpretaram a lei dos rabinos e a lei das Escrituras. Eles eram qualificados e autorizados pelas autoridades judaicas, altamente educados e leais ao sistema judaico. Os escribas eram geralmente hostis a Jesus. Eles se uniram com os fariseus, os principais sacerdotes, para buscar a morte de Jesus.
O fato de um escriba falar que seguiria Jesus para onde Ele fosse foi um fato fora do comum. Em certo sentido, ele estava dizendo algo que era muito culturalmente familiar. Os rabinos viajavam naqueles dias e tinham pequenos rebanhos de discípulos que os seguiam.
Seguir um mestre era muito comum no mundo antigo, não apenas em Israel, mas também no mundo grego. Este escriba estava dizendo: “De agora em diante eu quero me juntar ao seu grupo, você é meu Rabino”.
Ele estava se oferecendo como um aluno voluntário do milagreiro de Nazaré. Que melhor oferta poderia Jesus ter?
E, então, Jesus poderia fazer com que aquele escriba desse testemunho de como ele havia se afastado do legalismo de seu passado para a graça que foi encontrada em Jesus Cristo. Que testemunho maravilhoso seria. Ele poderia encabeçar suas reuniões, dando testemunhos e coisa e tal.
“Eu te seguirei aonde quer que vá”, implica alguma permanência. Implica mais do que uma decisão momentânea. Implica mais do que um momento de emoção. É o que aparentavam suas palavras.
Jesus era certamente o maior mestre que ele já tinha ouvido, a personalidade mais fascinante que ele já conhecera. E ele sabia que Jesus representava a destruição do legalismo que os escribas representavam.
Jesus o atraía. E ele pensou que estava dando a Ele o maior compromisso quando disse: “Eu te seguirei onde quer que você vá”.
Mas, Jesus já tinha visto isso antes. Jesus sabia o que havia nesse homem. João capítulo 2, versículos 23-25, dizem:
E, estando Jesus em Jerusalém pela páscoa, durante a festa, muitos, vendo os sinais que fazia, creram no seu nome. Mas o mesmo Jesus não confiava neles, porque a todos conhecia; E não necessitava de que alguém testificasse do homem, porque ele bem sabia o que havia no homem.
Eles estavam crendo Nele, mas Jesus sabia que era uma fé sem raízes, sem fundamento, passageira. Jesus recusou seguidores vindos de momentos de emoção. Ele conhece a natureza humana. Ele conhece sua instabilidade emocional. Ele sabe a sua inconstância. Ele conhece seu egocentrismo. Ele conhece seus desejos, anseios e amores.
O escriba viu as multidões, viu os milagres e ouviu o ensino. Ele queria estar associado a Jesus, porque não havia ninguém como Ele. Esta oferta era muito completa por parte do escriba, mas Jesus não a considerou suficiente. É realmente incrível.
Hoje, se alguém vem e diz: “Quero seguir a Jesus aonde quer que Ele me conduza”, o cristão evangélico comum vai dizer: “Faça esta oração, assine esta ficha e tudo estará certo”.
Jesus não faz isso. Ele diz a coisa mais incrível para aquele aspirante: “As raposas têm seus covis, e as aves do céu, ninhos; mas o Filho do Homem não tem onde reclinar a cabeça” (v.58).
Jesus conhecia a mente desse homem, porque, sendo Deus, Ele é onisciente. Desejos de conforto e facilidades pessoais estavam ali. Assim, Ele foi direto ao assunto.
As raposas estavam em toda parte em Israel naqueles dias e em dias mais antigos. Os pássaros estavam certamente em toda parte. Na época da migração, meio bilhão de pássaros migram da Europa através de Israel. Todo mundo sabia que os pássaros tinham ninhos e as raposas tinham tocas. São coisas básicas e comuns para esses animais.
Mas Ele diz que “o Filho do homem não tem onde reclinar a cabeça”. Pelo menos oitenta vezes Jesus se refere a Si mesmo como o Filho do Homem. É seu título favorito para Si mesmo.
Ele destaca não apenas que Ele é o Messias, porque é um título messiânico tirado de Daniel 7:13, mas também enfatiza o fato de Sua humanidade.
E, em Sua humilhação como o Filho do Homem, Ele diz: “Não tenho onde reclinar minha cabeça. Tudo o que eu posso te prometer, meu amigo, é que, se me seguires, pode significar que ficarás sem casa. Não espere facilidade e conforto”.
Por que Ele levanta esta questão? Porque havia um problema com aquele homem em seu coração. Autonegação, certo? “Se alguém vem após mim, negue-se a si mesmo”.
O que virá da parte de Jesus para mim? É o que a maioria está procurando. Essa é a maneira errada de proclamar o evangelho.
Não se trata de autossatisfação, mas de autonegação. Não é sobre o que eu recebo, mas sobre o que estou disposto a desistir.
É sobre o nível de desespero que diz a Jesus: “Olha, eu não estou em posição de exigir nada, minha condição é tão caótica que eu quero perdão, graça e o céu. Eu nada tenho a defender, desisto de mim e de tudo que tenho”.
A multidão que estava ali viu um homem disposto a tudo para seguir a Jesus, mas Jesus viu seu coração, Ele sabia exatamente o que ele estava pensando. E Ele disse: “Eu só quero que você saiba que não tenho certeza se vou encontrar um lugar para repousar minha cabeça”.
Isto estava conectado com a ocorrência registrada nos versículos 51-55 deste mesmo capítulo, quando uma aldeia de samaritanos o impediu de dormir lá. Tiago e João ficaram tão furiosos que queriam pedir fogo do céu para matar todos eles.
Bem como a ocorrência na cidade em que passou a maior parte de sua vida, Nazaré, quando a liderança religiosa O expulsou de lá e queria jogá-Lo montanha abaixo (Lucas 4:28-29).
Ou seja, Nazaré não O quis por lá, nem Cafarnaum e muito menos Jerusalém, para onde Ele estava se dirigindo neste momento. Ele quis dizer àquele aspirante emocionado: “Se você está esperando conforto, sai fora. Se você está entrando neste negócio pensando viver em um palácio confortável, desista. Adianto que isto não irá acontecer”.
Em Mateus 10, Jesus falou que Seus seguidores seriam como “ovelhas no meio de lobos”. Que eles seriam odiados, açoitados, perseguidos, presos, caluniados, mortos e que seus próprios familiares seriam seus inimigos.
Mas, em Mateus 10:22 Jesus diz: “E odiados de todos sereis por causa do meu nome; mas aquele que perseverar até ao fim será salvo”.
São essas pessoas, que perseveram, que provam que são crentes genuínos, seguindo todo o caminho até o fim através da perseguição, do ódio e da animosidade. Jesus falava de uma coroa no fim do caminho, mas também de uma cruz pelo caminho, um caminho de sofrimento.
Jesus falou das sementes que brotaram em solo pedregoso, que não foram adiante e morreram. O problema não estava na semente, mas no solo.
Este solo era como o aspirante de curto prazo, um discípulo que não tem raiz, sem profundidade. Ele queria acrescentar Jesus à sua vida, queria a emoção de segui-Lo, mas com uma vida sem sacrifícios.
Esta é a falsa fé. Não é a fé salvadora. Fazemos a Jesus um desserviço grave se levarmos as pessoas a acreditar que o caminho cristão é um caminho fácil. Não é fácil.
Ao segundo homem Jesus diz: “Siga-Me”.
Provavelmente ele tinha ouvido a conversa com o primeiro homem e diz: “Permita-me primeiro ir e enterrar meu pai”.
Agora, você pode pensar que o pai dele estava morto e o corpo esperando o enterro. Os judeus guardavam um mês de luto. Era honroso o filho enterrar seu pai com dignidade. Havia exceção se ele fosse um sumo sacerdote, que, de acordo Levítico 21, não poderia tocar num defunto, ou se tivesse feito um voto de nazireu, que de acordo Números 6, também não poderia tocar num defunto.
No entanto, não era este o motivo. Seu pai não estava morto. Ele sabia que o Senhor estava se afastando daquela região e disse que não tinha onde descansar a cabeça. Jesus era um itinerante, sempre em movimento. Ele está na estrada e ninguém sabia onde Ele poderia estar em um mês.
Ele não estaria lá se seu pai estivesse morto, porque os judeus enterravam os mortos imediatamente, não havia processo de embalsamento em Israel. Sabe o que ele quis dizer a Jesus?
Olha, eu vivi muito tempo para sair agora sem minha herança. Eu vou Te seguir, mas eu estava apenas ouvindo a conversa que Você teve com esse cara e disse que não tem nenhum lugar para colocar Tua cabeça… Os recursos são escassos aqui, Tu não podes nos prometer nada, nenhum evangelho de prosperidade, então, eu acho que seria melhor para eu ficar aguardando a garantia de meu sustento no futuro, para depois Te seguir.
“Eu devo enterrar meu pai” é uma declaração familiar no Oriente Médio, ainda usada até hoje. E quando eles usam e dizem: “Eu devo enterrar meu pai”, eles querem dizer que “eu devo ficar em casa até que meu pai tenha morrido e eu possa receber a minha herança”.
Então, o que aquele homem estava dizendo era: “Eu Te seguirei um dia, quando meu pai morrer e eu conseguir o que eu preciso”.
Ou seja, ele está atraído por Jesus, mas quem não estaria? Ele está espantado com o Seu poder, mas ele ama o dinheiro. Ele é como o solo cheio de espinhos que sufocaram a semente que brotou. Os cuidados da vida e o engano das riquezas sufocaram a insuficiente fé do aspirante.
Ele está dizendo: “Eu esperei muito tempo para não ganhar dinheiro… Quero o que meu pai tem e o que está vindo para mim.”
E Jesus faz uma repreensão: “Deixa aos mortos o sepultar os seus próprios mortos. Tu, porém, vai e prega o reino de Deus”.
Isso revela menos do que boas intenções. Isso não é honroso. As intenções daquele homem não eram boas. Jesus faz referência aos espiritualmente mortos.
Ou seja, Ele está dizendo: “Os mortos cuidam das coisas mortas, temporais e passageiras”. O convite de Cristo é a respeito de coisas eternas. É um convite a entrar e batalhar por um reino glorioso que não pertence a este mundo condenado ao fogo.
O coração daquele homem estava ligado ao mundo e a seus cuidados. Suas prioridades eram confusas. Jesus estava ali, diante dele, mas ele vislumbrava suas futuras posses. Jesus saiu dali e prosseguiu, e aquele homem ficou esperando pelos tesouros perecíveis.
Ele é como o jovem rico em Mateus 19, que foi a Jesus e perguntou: “Bom Mestre, que bem farei para conseguir a vida eterna?” (v.16). E Jesus lhe disse: “Se queres, porém, entrar na vida, guarda os mandamentos” (v.17).
O homem responde convicto: “Tudo isso tenho guardado desde a minha mocidade; que me falta ainda?” (v.20). Isso é um problema grave.
E, então, Jesus fala de submissão e abnegação: “Vai, vende tudo o que tens e dá-o aos pobres, e terás um tesouro no céu; e vem, e segue-me”.
E ele foi embora. Não era isso que ele estava disposto a fazer. Não havia abnegação lá. Ele não negaria sua autojustiça e suas próprias posses. E assim ele foi embora… Figura trágica.
Jesus colocou as barreiras no momento apropriado para garantir que a devoção fosse completa e consumada.
E ali estava um homem a quem Jesus solicitou que O seguisse, mas ele respondeu que só poderia fazer isto em algum momento no futuro, depois de ter recebido sua herança.
Não há conciliação entre o reino de Deus e os interesses e as ambições pessoais. Se você ama o mundo ou as coisas que estão no mundo, o amor do Pai não está em você.
O terceiro aspirante, provavelmente ouvindo tudo, diz: “Seguir-te-ei, Senhor; mas deixa-me primeiro despedir-me dos de casa”.
Ou seja, ele está dizendo: “Eu não vou ser como esse cara, eu vou Te seguir e eu não vou esperar até que meu pai esteja morto, eu só quero ir para casa e dizer um até logo”.
Talvez estivesse pensando em recolher algum dinheiro para uma jornada de poucos dias com Jesus, ou mesmo ser impedido por seus pais.
Jesus viu no coração daquele homem algo que o impedia de ser fiel a um compromisso de segui-Lo. Os vínculos familiares eram uma barreira a ele. Ele não amava Cristo acima de seus vínculos e sua própria vida.
Jesus lhe responde: “Ninguém que, tendo posto a mão no arado, olha para trás é apto para o reino de Deus”. O agricultor que está arando a terra não pode, de forma alguma, olhar para trás, caso contrário, perderá o rumo e fará um sulco irregular na terra.
Jesus quis dizer: “Você não pode Me seguir olhando para trás. Você não pode ter um coração dividido”.
Aquele que verdadeiramente está sendo levado pelo Espírito de Deus e trazido para o reino vai dizer: “Olha, Jesus Cristo é tão infinitamente valioso para mim que eu não me importo com o preço de segui-Lo, eu vou com prazer me desfazer de tudo para entrar em Seu reino”.
É como aquele mercador, que se encantou tanto com uma pérola, que vendeu tudo que tinha para a ter consigo (Mateus 13:45-46).
A questão aqui é a salvação, a entrada no reino. E se você já se perguntou qual era o problema aqui, algumas pessoas pensam que é uma espécie de discipulado de segundo nível. Não é. E o versículo 62 deixa claro. É sobre entrar no reino.
Jesus está simplesmente dizendo a estas pessoas: “Olha, se você está ligado a qualquer coisa, você não pode entrar. A salvação é para aqueles que vieram em total abnegação”.
O Senhor pode não tirar todo o seu conforto, bens e relacionamentos, mas você não vem a Ele negociando. Você está simplesmente dizendo que o valor infinito do evangelho de Jesus Cristo é tão grande que, se Ele pedir, você desistirá de tudo.
Assim, responder corretamente a Cristo não é uma questão de emoção, não se trata de uma aceitação momentânea ou de uma decisão. Não é um interesse superficial. Não é sequer uma questão de dizer: “Eu seguirei”. É uma questão de abnegação total, vontade de desistir de tudo, porque o valor de Cristo é infinito.
O pecador alcança esse nível de desespero com a inspiração do Espírito Santo. Jesus disse:
Se alguém quer vir após mim, negue-se a si mesmo, e tome cada dia a sua cruz, e siga-me. Porque, qualquer que quiser salvar a sua vida, perdê-la-á; mas qualquer que, por amor de mim, perder a sua vida, a salvará. (Lucas 9:23-24).
Trata-se de perder a sua vida. Trata-se de odiar a si mesmo. É sobre aferrar-se a nada. É uma atitude de felicidade profunda por encontrar o Rei, o Salvador.
A Bíblia não diz o que aconteceu com aqueles três aspirantes, mas é consideravelmente óbvio que eles deixaram Cristo para manter seus amores terrenos. Que decisão triste.
A pérola de grande preço está disponível para aqueles que vendem tudo que possuem para adquiri-la. O tesouro escondido no campo está disponível para aqueles que vendem tudo que possuem para adquirir aquele campo. Assim é com os verdadeiros discípulos. Eles entraram numa vida de seguir Jesus deixando tudo para trás. Vamos orar.
Pai, Te agradecemos esta manhã pelas palavras do nosso precioso Salvador. Se alguma vez quisemos aprender a evangelizar, não poderíamos ter um professor melhor.
Às vezes, desejamos muito que as pessoas venham a Cristo, correndo o risco de que alteremos e adaptemos a mensagem para obter uma resposta momentânea desejada e tudo o que fazemos é plantar joio em vez de trigo. Tenho certeza que em todo o mundo há pessoas que tomaram uma decisão por Cristo, mas não seguem Jesus.
Pessoas a quem foi dito que poderiam seguir Jesus e permanecer presas ao mundo, poderiam ter sua própria maneira de seguir e até podem pensar que estão salvas, mas não estão. Eu só peço, Senhor, que Tu tragas a clareza do evangelho, clareza aos convites, aos pecadores.
Proteja-nos de alterar a verdade e, portanto, colocar as pessoas involuntariamente na estrada larga que leva à destruição. Ajuda-nos a evangelizar da maneira como Jesus fez, exigindo um compromisso total. Sabemos que isso é difícil.
É uma mensagem difícil e é difícil de crer nela. Na verdade, é impossível, exceto através da poderosa obra do Espírito Santo. Quando o Espírito Santo se propõe a fazer Sua obra para convencer do pecado, da justiça e do juízo e quebrar o amor-próprio e a auto-estima do pecador e a ambição pessoal, quando o Espírito Santo faz Sua obra, parte de Sua obra é a graça e a misericórdia da abnegação.
Para aqueles em quem o Espírito trabalha, precisamos ser fiéis para trazer a verdadeira mensagem, para que o genuinamente penitente e auto-negado pecador, que vê o infinito valor de Cristo, possa entender a verdade da fé salvadora. Usa-nos dessa maneira, oramos por Tua glória. Amém.
Este texto é uma síntese do sermão “Barriers to True Discipleship”, de John MacArthur em 27/04/2003.
Você pode ouvi-lo integralmente (em inglês) no link abaixo:
http://www.gty.org/resources/sermons/42-133/barriers-to-true-discipleship
Tradução e síntese feitos pelo site Rei Eterno