A confissão da própria fraqueza
Contra mim confessarei a minha iniquidade! (Sl. 31:5); confessar-te-ei, Senhor, a minha fraqueza.
Muitas vezes, a menor coisa basta para me abater e entristecer.
Às vezes, é de uma coisa mesquinha que me vem grave aflição.
E quando me julgo tanto quanto seguro, vejo-me, não raro, vencido por um sopro, quando menos o penso.
Olhai, pois, Senhor, para esta minha baixeza e fragilidade, que conheces perfeitamente. Compadece-te de mim e tira-me da lama, para que eu não fique atolado e arruinado para sempre (Sl 68:18).
Conforta-me com a força celestial, para que não me vença e domine o velho homem, a mísera carne, ainda não inteiramente sujeita ao espírito, contra a qual será necessário pelejar enquanto estiver nesta miserável vida.
Oh! Que vida é esta, em que nunca faltam as tribulações e misérias, em que tudo está cheio de inimigos e ciladas!
Porque mal acaba uma tribulação ou tentação, outra já se aproxima, e até antes de acabar um combate, muitos outros já sobrevêm inesperados.
E como se pode amar uma vida cheia de tantas armaguras, sujeitas a tantas calamidades e misérias?
E, não obstante, muitos a amam e procuram nela deleitar-se.
Muitos acusam o mundo de ser enganador e vão, e ainda assim lhes custa deixá-lo, porque se deixam dominar pelos apetites da carne.
Muitas coisas nos inclinam a amar o mundo, outras a desprezá-lo.
Fazem amar o mundo a concupiscência da carne, a concupiscência dos olhos e a soberba da vida; mas as consequências danosas que dessas coisas vêm geram o ódio e o aborrecimento para com o mundo.
Aqueles que perfeitamente desprezam o mundo e procuram viver para Deus, em santa disciplina, experimentam a doçura divina, prometida aos verdadeiros abnegados, e mais claramente conhecem os erros grosseiros do mundo e seus vários enganos.
Quanto melhor te dispões para padecer, tanto mais paciente serás em tuas ações; com a resignação e o hábito de sofrer torna-se também mais suave o sofrimento.
Não é verdadeiro sofredor quem só quer sofrer a quantidade que julga ser suficient e que escolhe de quem deve ou não deve suportar as injúrias e agravos.
O verdadeiro paciente também não repara em quem exercita a paciência; se é seu superior, ou igual, ou inferior, se é homem bom e santo, ou mau e perverso.
Mas, sem diferença de pessoa, sempre que lhe sobrevem qualquer adversidade, aceita-a gratamente da mão de Deus e a considera um grande lucro para a sua alma.
Porque aos olhos de Deus, qualquer coisa, por insignificante que seja, que soframos por amor a Ele, terá seu merecimento.
Aparelha-te, pois, para a luta, se queres a vitória.
Sem combate não podes chegar à coroa da paciência.
Torna-me, Senhor, possível pela graça, o que me parece impossível pela natureza. Tu bem sabes quão pouco sei sofrer e que fico desanimado com a menor adversidade.
Torna-me amável e desejável qualquer prova e aflição, por Teu amor, porque o padecer e sofrer por Ti é muito proveitoso à minha alma.”
Tomás de Kempis (1380 – 1471)